História, qualidades, lendas e xire de exú orixa

historia qualidades lendas e xire de exu orixa


exú orixa e sua historia




é o 1º nascido da existência e, como tal, o símbolo do elemento
procriado. Mensageiro dos orixás , elemento de ligação entre as
divindades e os homens , a um tempo mais próximo do mundo terreno e mais
per to do elevadíssimo espaço celeste por onde transita orúnmìlà é um
orixá, é sempre a primeira divindade a receber as oferendas, justamente
para que atue como um aliado e não como um rival q ue perturbe os
procedimentos místicos desenvolvidos durante os rituais  corrente com
seu lugar mítico privilegiado, é ele que abre esse "corpus mitopoético"
. Princípio dinâmico e princípio da existência individualizada, Exú não
pode ser isolado ou classificado em nenhuma das categorias. Ele é como o
axé que  ele representa e transporta), participa forçosamente de tudo.
Segundo Ifá cada um tem seu próprio exú e seu próprio Olorún em seu
corpo. O nome de exú é conhecido, invocado e cultuado junto ao orixá. E
é Ifá quem revela e permite-nos sabê-lo. Quem delegou esse poder à exú
foi Olorún ao entregar-lhe o àdó-iràn , a cabaça que contém a força que
se propaga. Esta cabaça está presente em seus "assentos", é uma cabaça
de pescoço grande, e basta exú apontá-la a algo para transmitir seu axé.
O Òkòtó representa o crescimento Agbárá - poder que permite a cada um se
mobilizar e desenvolver suas funções e seus destinos. Por isso recebe o
título de Elegbára (senhor do poder). Oxé-tuwá, representante direto de
exú, simboliza um de seus aspectos mais importantes, o de ser
encarregado e transportador das oferendas, Òjise-ebo. Exú Elegbára =
senhor do poder...Conhecido como Elegbára (ele=dono, senhor ;
agbara=poder), contém muitas definições e funções. É o companheiro de
Ogum. Exú Yangi = pedra vermelha de laterita, pedaços de laterita
cravados na terra, indicam o lugar de culto à Exú. Yangi é a
representação mais importante de Exú e, é assim invocado: EXÚ YANGI OBÁ
BABÁ EXÚ EXÚ YANGI rei, pai de todos os Exú. Exú Yangi é o Exú ancestre,
o Exú Agbá. Exú Àgbá = pai-ancestre (representação coletiva de todos os
exús individuais) Exú Obá - rei-de-todos Exú Alakétu = título dado a exú
pelos ké tu da Bahia - rei do povo Kétu - Exú Elebo =
senhor-das-oferendas Exú Ojìse-ebo = encarregado-e-transportador de
oferendas Exú Elérú = senhor do erú (carrego) Exú Olòbe = proprie
n{7}[e1.jpg] tário e senhor da faca Exú Enú-gbárijo = explicitador de
mensagens Exú Bara = o rei do corpo (obá + ara) (princípio de vida
individual) Exú Odara = aquele que guia (mostra o caminho, vai na
frente) Exú por ser resultado da inter ação de um par, é o portador
mítico do sêmen e do útero ancestral e como princípio de vida
individualizada ele sintetiza os dois, É por isso que frequentemente, e,
é representado pela forma de um par, uma figura masculina e uma
feminina, unidos por fileiras de búzios. Exú está profundamente ligado à
atividade sexual. Representados por um falo (pênis), ou suas
representações simbólicas como: os penteados de forma fálica, sua arma,
o ogó - bastão em forma de pênis -, sua lança; já as cabacinhas
representam seus testículos. Exú também está representado com objetos à
sua boca; dedo, cachimbo e principalmente flauta, que vem representar a
atividade sexual, como absorção e expulsão, ingestão e restituição, com
a flauta Exú chama seus descendentes. Portanto símbolo por excelência da
fecundidade. Exú jamais toma a forma de procriador. Exú é cultuado tanto
como lésè-égún, como lésè-orixá, e apenas por seu intermédio é possível
cultuar os orixás e as Iyá-mi (mãe ancestre). Não é apenas Òjisé-ebo,
mas principalmente Òjisé, o mensageiro, fazendo a comunicação entre tudo
que é oposto. Com efeito a relação entre Exú e Ifá, é indiscutível, e
Exú está representado em um dos principais emblemas característicos do
culto à Ifá , o òpón, onde Exú tem sua representação em forma de rosto,
de triângulos e losangos. É no seu papel de princípio dinâmico, de
princípio de vida individual e de Òjise ou elemento de comunicação, que
Exú Bará está indissoluvelmente ligado à evolução e ao destino de cada
indivíduo. Como tal ele também é senhor dos caminhos Exú Olònà, e ele
pode abri-los ou fechá-los. Exú fica à esquerda dos caminhos. O elemento
procriado, é a prova do poder das Iyá-mi, é o pássaro, o Elèye. Exú foi
o primeiro a usar ekódide (pena de uma espécie de papagaio) na cabeça, e
foi isto que o tornou decano de todos os orixás. Alguém que coloca
ekódide na cabeça sem necessidade, provoca a cólera de Exú.
Enganosamente ou mal intencionados, os primeiros missionários que
chegaram à África, compararam-no ao diabo, por algumas de  suas formas,
artimanhas e poderes atribuídos. Ele tem as qualidades dos seus
defeitos, pois é dinâmico e jovial, havendo mesmo pessoas na África que
usam orgulhosamente nomes como Èxúbíyìí (concebido por exú), ou Èxùtósìn
(Exú merece ser adorado). Como personagem histórica, Exú teria sido um
dos companheiros de Oduduà quando da sua chegada à Ifé, e chamava-se
Exú Obasin. Tornou-se mais tarde, um dos assistentes de Orúnmilá, que
preside a adivinhação pelo sistema de Ifá. Segundo Epega, Exú, tornou-se
rei de Kêto sob o nome de Exú Alákétu. É Exú que supervisiona as
atividades do rei em cada cidade: o de Oyó é chamado Exú Akesan. Como
orixá, diz-se que veio ao mundo com um porrete, chamado, ogó, que teria
a propriedade de transportá-lo, a centenas de quilômetros e de atrair,
por um poder magnético, objetos situados a distâncias igualmente
grandes.
QUALIDADES DE EXU ORIXA




Elegbára Alákétu Laalu Jelu Run danto Tiriri Lonan Jele bara Anan ou
Inan Bará Jigidi Mavambo Embeberekete Sinza Muzila Sandú Baragbo Akesan
Baralajki Betire Lamu Bata Okanlelogun


0" Exu Yangi - o Senhor da Laterita Vermelha " Exu Agba - o Senhor
Ancestral " Exu Igba Keta - o Senhor da Terceira Cabaça " Exu Okoto - o
Senhor do Caracol " Exu Oba Baba Esu - o Rei e Pai de todos os Eshus "
Exu Odara - o Senhor da Felicidade " Exu Osije - o Mensageiro Divino "
Exu Eleru - o Senhor da Obrigação Ritual " Exu Enu Gbarijo - o Senhor da
Boca Coletiva " Exu Elegbara - o Senhor do Poder Mágico " Exu Bara - o
Senhor do Corpo " Exu LOnan - o Senhor dos Caminhos " Exu OlObe - o
Senhor da Faca " Exu ElEbo - o Senhor das Oferendas " Exu Alafia - o
Senhor da Satisfação Pessoal " Exu Oduso - o Vigia dos Odus


Lendas de exu:







Exú instaura o conflito entre Iemanjá, Oyá e Oxum. [Lenda 24 do Livro
Mitologia  dos Orixás]


Um dia, foram juntas ao mercado Oyá e  Oxum, esposas de Xangô, e
Iemanjá, mãe de Ogum.
Exu entrou no mercado conduzindo uma  cabra.
Ele viu que tudo estava em paz e decidiu  plantar uma discórdia.
Aproximou-se de Iemanjá, Oyá e Oxum e  disse que tinha um compromisso
importante com Orunmila.
Ele deixaria a cidade e pediu a elas que  vendessem sua cabra por vinte
búzios. Propôs que ficassem com a metade do lucro  obtido.
Iemanjá, Oyá e Oxum concordaram e Exu  partiu.
A cabra foi vendida por vinte búzios. Iemanjá, Oyá e Oxum puseram os dez
búzios de Exu a parte e começaram a dividir  os dez búzios que lhe
cabiam. Iemanjá contou os búzios. Haviam três búzios para  cada uma
delas, mas sobraria um. Não era possível dividir os dez em três partes
iguais. Da mesma forma Oyá e Oxum tentaram e não conseguiram dividir os
búzios  por igual. Aí as três começaram a discutir sobre quem ficaria
com a maior parte.
Iemanjá disse: "É costume que os mais  velhos fiquem com a maior porção.
Portanto, eu pegarei um búzio a mais".
Oxum rejeitou a proposta de Iemanjá,  afirmando que o costume era que os
mais novos ficassem com a maior porção, que  por isso lhe cabia.
Piá intercedeu, dizendo que , em caso de  contenda semelhante, a maior
parte caberia à do meio.
As três não conseguiam resolver a  discussão. Então elas chamaram um
homem
do mercado para dividir os búzios  eqüitativamente entre elas. Ele pegou
os búzios e colocou em três montes iguais. E sugeriu que o décimo búzio
fosse dado a mais velha. Mas Oyá e Oxum, que eram a  segunda mais velha
e a mais nova, rejeitaram o conselho. Elas se recusaram a dar  a Iemanjá
a maior parte.
Pediram a outra pessoa que dividisse  eqüitativamente os búzios. Ele os
contou, mas não pôde dividi-los por igual. Propôs que a parte maior
fosse dado à mais nova. Iemanjá e Oyá.
Ainda um outro homem foi solicitado a  fazer a divisão. Ele contou os
búzios, fez três montes de três e pôs o búzio a  mais de lado. Ele
afirmou que, neste caso, o búzio extra deveria ser dado àquela  que não
é nem a mais velha, nem a mais nova. O búzio devia ser dado a Oyá. Mas
Iemanjá e Oxum rejeitaram seu conselho. Elas se recusaram a dar o búzio
extra a  Oyá.
Não havia meio de resolver a divisão.
Exu voltou ao mercado para ver como estava  a discussão. Ele disse:
"Onde está minha parte?".
Elas deram a ele dez búzios e pediram para  dividir os dez búzios delas
de modo eqüitativo.
Exu deu três a Iemanjá, três a Oyá e três a  Oxum. O décimo búzio ele
segurou.
Colocou-o num buraco no chão e cobriu com  terra.
Exu disse que o búzio extra era para os  antepassados, conforme o
costume que se seguia no Orum
Toda vez que alguém recebe algo de bom,  deve-se lembrar dos
antepassados.Dá-se uma parte das colheitas, dos banquetes e  dos
sacrifícios aos Orixás, aos antepassados. Assim também com o dinheiro.
Este  é o jeito como é feito no Céu. Assim também na terra deve ser.
Quando qualquer coisa vem para alguém,  deve-se dividi-la com os
antepassados. "Lembrai que não deve haver disputa pelos  búzios."
Iemanjá, Oyá e oxum reconheceram que Exu  estava certo. E concordaram em
aceitar três búzios cada.
Todos os que souberam do ocorrido no  mercado de Oió passaram a ser mais
cuidadosos com relação aos antepassados, a  eles destinando sempre uma
parte importante do que ganham com os frutos do  trabalho e com os
presentes da fortuna.

Exú torna-se o amigo predileto de Orunmila. [Lenda 27 do Livro Mitologia
dos Orixás]
Como se explica a grande amizade entre  Orunmila e Exu, visto que eles
são opostos em grandes aspectos ?
Orunmila, filho mais velho de Olorun, foi  quem trouxe aos humanos o
conhecimento do destino pelos búzios. Exu, pelo  contrario, sempre se
esforçou para criar mal-entendidos e rupturas, tanto aos  humanos como
aos Orixás. Orunmila era calmo e Exu, quente como o fogo.
Mediante o uso de conchas adivinhas,  Orunmila revelava aos homens as
intenções do supremo deus Olorun e os  significados do destino. Orunmila
aplainava os caminhos para os humanos,  enquanto Exu os emboscava na
estrada e fazia incertas todas as coisas. O caráter  de Orunmila era o
destino, o de Exu, era o acidente. Mesmo assim ficaram amigos  íntimos.
Uma vez, Orunmila viajou com alguns  acompanhantes. Os homens de seu
séqüito não levavam nada, mas Orunmila portava  uma sacola na qual
guardava o tabuleiro e os Obis que usava para ler o futuro.
Mas na comitiva de Orunmila muitos tinham  inveja dele e desejavam
apoderar-se de sua sacola de adivinhação. Um deles  mostrando-se muito
gentil, ofereceu-se para carregar a sacola de Orunmila. Um  outro também
se dispôs à mesma tarefa e eles discutiram sobre quem deveria  carregar
a tal sacola.
Até que Orunmila encerrou o assunto  dizendo: "Eu não estou cansado. Eu
mesmo carrego a sacola".
Quando orunmila chegou em casa, refletiu  sobre o incidente e quis saber
quem realmente agira como um amigo de fato. Pensou então num plano para
descobrir os falsos amigos. Enviou mensagens com a  notícia de que havia
morrido e escondeu-se atrás da casa, onde não podia ser  visto. E lá
Orunmila esperou.
Depois de um tempo, um de seus  acompanhantes veio expressar seu pesar.
O homem lamentou o acontecido, dizendo  ter sido um grande amigo de
Orunmila e que muitas vezes o ajudara com dinheiro. Disse ainda que, por
gratidão, Orunmila lhe teria deixado seus instrumentos de  adivinhar.
A esposa de Orunmila pareceu compreende-lo,  mas disse que a sacola
havia desaparecido. E o homem foi embora frustrado.
Outro homem veio chorando, com artimanha  pediu a mesma coisa e também
foi embora desapontado. E assim, todos os que  vieram fizeram o mesmo
pedido. Até que Exu chegou.
Exu também lamentou profundamente a morte  do suposto amigo. Mas disse
que a tristeza maior seria da esposa, que não teria  mais pra quem
cozinhar. Ela concordou e perguntou se Orunmila não lhe devia  nada. Exu
disse que não. A esposa de Orunmila persistiu, perguntando se Exu não
queria a parafernália de adivinhação
Exu negou outra vez. Aí Orunmila entrou na  sala, dizendo: "Exu, tu és
sim meu verdadeiro amigo!".
Depois disso nunca teve amigos tão  íntimos, tão íntimos como Exu e
Orunmila.



Exu leva aos homens o oráculo de Ifá  [Lenda 28 do livro Mitologia dos
Orixás]
Em épocas remotas os deuses passaram fome. Às vezes, por longos
períodos, eles não recebiam bastante comida de seus filhos  que viviam
na Terra.
Os deuses cada vez mais se indispunham uns  com os outros e lutavam
entre si guerras assombrosas. Os descendentes dos deuses  não pensavam
mais neles e os deuses se perguntavam o que poderiam fazer. Como  ser
novamente alimentados pelos homens ? Os homens não faziam mais oferendas
e  os deuses tinham fome. Sem a proteção dos deuses, a desgraça tinha se
abatido  sobre a Terra e os homens viviam doentes, pobres, infelizes.
Um dia Exu pegou a estrada e foi em busca  de solução. Exu foi até
Iemanjá em busca de algo que pudesse recuperar a boa  vontade dos
homens. Iemanjá lhe disse: "Nada conseguirás. Xapanã já tentou  afligir
os homens com doenças, mas eles não vieram lhe oferecer sacrifícios".
Iemanjá disse: "Exu matará todos os  homens, mas eles não lhe darão o
que comer. Xangô já lançou muitos raios e já  matou muitos homens, mas
eles nem se preocupam com ele. Então é melhor que  procures solução em
outra direção.Os homens não tem medo de morrer. Em vez de  ameaçá-los
com a morte, mostra a eles alguma coisa que seja tão boa que eles
sintam vontade de tê-la. E que, para tanto, desejem continuar vivos".
Exu retornou o seu caminho e foi procurar  Orungã.
Orungã lhe disse: "Eu sei por que vieste. Os dezesseis deuses tem fome.
É preciso dar aos homens alguma coisa de que eles  gostem, alguma coisa
que os satisfaça.. Eu conheço algo que pode fazer isso. É  uma grande
coisa que é feita com dezesseis caroços de dendê. Arranja os cocos da
palmeira e entenda seu significado. Assim poderás conquistar os homens".

Exu foi ao local onde havia palmeiras e  conseguiu ganhar dos macacos
dezesseis cocos. Exu pensou e pensou, mas não  atinava no que fazer com
eles. Os macacos então lhe disseram: "Exu, não sabes o  que fazer com os
dezesseis cocos de palmeira? Vai andando pelo mundo e em cada  lugar
pergunta o que significam esses cocos de palmeira. Deves ir a dezesseis
lugares para saber o que significam esses cocos de palmeira. Em cada um
desses  lugares recolheras dezesseis odus. Recolherás dezesseis
histórias, dezesseis  oráculos. Cada história tem a sua sabedorias,
conselhos que podem ajudar os  homens. Vai juntando os odus e ao final
de um ano terás aprendido o suficiente. Aprenderás dezesseis vezes
dezesseis odus. Então volta para onde moram os  deuses. Ensina aos
homens o que terás aprendido e os homens irão cuidar de Exu  de novo".
Exu fez o que lhe foi dito e retornou ao  Orun, o Céu dos Orixás. Exu
mostrou aos deuses os odus que havia aprendido e os  deuses disseram:
"Isso é muito bom".
Os deuses, então, ensinaram o novo saber  aos seus descendentes, os
homens.Os homens então puderam saber todos os dias os  desígnios dos
deuses e os acontecimentos do porvir. Quando jogavam os dezesseis  cocos
de dendê e interpretavam o odu que eles indicavam, sabiam da grande
quantidade de mal que havia no futuro. Eles aprenderam a fazer
sacrifícios aos  Orixás para afastar os males que os ameaçavam. Eles
recomeçavam a sacrificar  animais e a cozinhar suas carnes para os
deuses. Os Orixás estavam satisfeitos e  felizes. Foi assim que Exu
trouxe aos homens o Ifá.

LENDAS DE EXU


Exú sempre foi o mais alegre e comunicativo de todos os orixás.
Olorun, quando o criou, deu-lhe, entre outras funções, a de comunicador
e elemento de ligação entre tudo o que existe.
Por isso, nas festas que se realizavam no orun (céu), ele tocava
tambores e cantava, para trazer alegria e animação a todos.
Sempre foi assim, até que um dia os orixás acharam que o som dos
tambores e dos cânticos estavam muito altos, e que não ficava bem tanta
agitação.
Então, eles pediram a Exú, que parasse com aquela actividade barulhenta,
para que a paz voltasse a reinar.
Assim foi feito, e Exú nunca mais tocou seus tambores, respeitando a
vontade de todos.
Um belo dia, numa dessas festas, os orixás começaram a sentir falta da
alegria que a música trazia.
As cerimônias ficavam muito mais bonitas ao som dos tambores.
Novamente, eles se reuniram e resolveram pedir a Exú que voltasse a
animar as festas, pois elas estavam muito sem vida.
Exú negou-se a fazê-lo, pois havia ficado muito ofendido quando sua
animação fora censurada, mas prometeu que daria essa função para a
primeira pessoa que encontrasse.
Logo apareceu um homem, de nome Ogan.
Exú confiou-lhe a missão de tocar tambores e entoar cânticos para animar
todas as festividades dos orixás.
E, daquele dia em diante, os homens que exercessem esse cargo seriam
respeitados como verdadeiros pais e denominados Ogans.

II
EXÚ # Um Orishá Muito Polémico
Por Ìyá Sandra Medeiros Epega
Atoto arere.
Ifá fe f'oun e dake.
Orunmilá e Exú eram amigos, mas disputavam entre si o poder.
Houve uma guerra na cidade de Ajala Eremi.
Tendo isso chegado ao conhecimento de Exú, por seus seguidores que
invocavam-no e pediam a sua ajuda, ele correu a Orunmilá para contar a
novidade.
Orunmilá ficou curioso de saber como Exú já sabia da guerra, uma vez que
a cidade era longe e parcos os recursos.
Exú, muito vaidoso, disse saber tudo, em virtude de seus poderes, e
completou - "Vamos lá salvá-los".
Viajaram juntos, e chegando à Ajala Eremi, ajudaram o povo a vencer a
guerra, e foram reverenciados e louvados.
Na volta, Exú disse a Orunmilá - "Você vai ver, a minha magia é maior
que a sua".
Orunmilá riu, disse que seus poderes eram bem maiores, e disse também:

"Ki okunrin ma to ato rin
Ki obinrin ma to ato rin
Ki awo eni ti aso re yio rin".
"O homem fica em pé e urina andando
A mulher fica em pé e urina andando
Vamos ver a roupa de quem fica molhada primeiro".

Com essas palavras ele desafiou Exú.
Caminharam muito até que anoiteceu, e pararam em Ileto (pequena cidade
baale - aldeia pobre).
Orunmilá pediu aos mais velhos pousada por uma noite para ambos.
O Rei permitiu que dormissem e determinou em que casa ficariam.
No meio da noite, estando Orunmilá dormindo, Exú acordou bruscamente.
Exu saiu para o pátio, foi ao local onde as galinhas dormiam, agarrou o
galo pelos pés, torceu-lhe o pescoço, arrancou-lhe a cabeça e enfiou no
bolso.
Fez uma ótima e solitária refeição com a carne e alguns inhames,
pimentas, tomates e cebolas que achou nos campos, temperou tudo com óleo
dendê, bebeu vinho de palma e completou com litros e litros de água
fresca.
Voltando à casa, chamou Orunmilá, e disse -" Vamos embora depressa".
Orunmilá acordou estremunhado, e ainda tonto, achou que era de manhã, e
seguiu com Exú pela estrada como bons amigos.
Em Ileto, assim que amanheceu, descobriram a morte do galo, a fuga dos
hóspedes e o povo, revoltado, decidiu persegui-los.
Juntaram os Ode (soldados).
Correram atrás de Exú e Orunmilá e alguém lembrou que Exú usava uma
roupa de búzios (símbolo de magia).
Exú sabia que o povo de Ileto e os soldados vinham em sua perseguição.
Olhava para trás e ria.
Falou a Orunmilá -"O povo vem aí, traz lanças, facas e soldados.
Mostre a força de sua magia agora".
Orunmilá, sempre muito calmo, disse a Exú -"A mim não pegam. Eu adivinho
que você matou o galo e comeu-o, porque o sangue pinga de seu bolso".
E disse "A ki gbo iku a fibi oba sa".
("Não se pode ter má notícia da terra. Ela não morre".)
Depois de proferir estas palavras mágicas, Orunmilá disse a Exú:
-"Agora você dá a solução".
Exú sugeriu que subissem em uma árvore sagrada (ikin), de cuja madeira
são feitos instrumentos para o culto, e esperassem para ver os Ode
passarem.
Os soldados e o povo viram o sangue, e revistando a árvore acharam Exú
lá em cima, junto com Orunmilá.
Alguns ficaram de guarda à árvore, enquanto outros foram buscar machados
e facões para derrubá-la.
Quando começaram a cortar a árvore, Exú riu e disse a Orunmilá:
- "É agora!
Vamos cair os dois, faça a sua magia, eu faço a minha e veremos qual o
poder maior".
A árvore caiu.
Orunmilá se enterrou no chão e virou água.
Exú bateu no chão e virou pedra.
O povo e os Ode procuraram e não acharam ninguém.
O lugar virou uma grande confusão, com todos gritando e se acusando
mutuamente.
Os que estavam sedentos, viram a água que era Orunmilá, beberam dela e
se acalmaram.
Os que estavam cansados sentaram na pedra que era Exú e ficaram
agitados.
E daí para a frente, dois tipos de pessoas se criaram no mundo, os
calmos e os agitados.
E todos que jogam Ifá (antigo sistema yorubá de adivinhação), têm que
cultuar Exú e Orunmilá.

III
Exu foi o primeiro filho de Iemanjá e Oxalá.
Ele era muito levado e gostava de fazer brincadeiras com todo mundo.
Tantas fez que foi expulso de casa.
Saiu vagando pelo mundo, e então o país ficou na miséria, assolado por
secas e epidemias.
O povo consultou Ifá, que respondeu que Exu estava zangado porque
ninguém se lembrava dele nas festas; e ensinou que, para qualquer ritual
dar certo, seria preciso oferecer primeiro um agrado a Exu.
Desde então, Exu recebe oferendas antes de todos, mas tem que obedecer
aos outros Orixás, para não voltar a fazer tolices.

IV
Um homem rico tinha uma grande criação de galinhas.
Certa vez, chamou um pintinho muito travesso de Exu, acrescentando
vários xingamentos.
Para se vingar, Exu fez com que o pinto se tornasse muito violento.
Depois que se tornou galo, ele não deixava nenhum outro macho sossegado
no galinheiro: feria e matava todos os que o senhor comprava.
Com o tempo, o senhor foi perdendo a criação e ficou pobre.
Então, perguntou a um babalaô o que estava acontecendo.
O sacerdote explicou que era uma vingança de Exu e que ele precisaria
fazer um ebó pedindo perdão ao Orixá.
Amedrontado, o senhor fez a oferenda necessária e o galo se tornou
calmo, permitindo que ele recuperasse a produção.

V
Certa vez, dois amigos de infância, que jamais discutiam, esqueceram-se,
numa segunda-feira, de fazer-Ihe as oferendas devidas para Èsù.
Foram para o campo trabalhar, cada um na sua roça.
As terras eram vizinhas, separadas apenas por um estreito canteiro.
Èsù, zangado pela negligência dos dois amigos, decidiu preparar-Ihes um
golpe à sua maneira.
Ele colocou sobre a cabeça um boné pontudo que era branco do lado
direito e vermelho do lado esquerdo.
Depois, seguiu o canteiro, chegando à altura dos dois trabalhadores
amigos e, muito educadamente, cumprimentou-os:
-"Bom trabalho, meus amigos!"
Estes, gentilmente, responderam:
-"Bom passeio, nobre estrangeiro!"
Assim que Èsù afastou-se, o homem que trabalhava no campo à direita,
falou para o seu companheiro:
-"Quem pode ser este personagem de boné branco?"
-"Seu chapéu era vermelho", respondeu o homem do campo a esquerda.
-"Não, ele era branco, de um branco de alabastro, o mais belo branco que
existe!"
-"Ele era vermelho, um vermelho escarlate, de fulgor insustentável!"
-"Ele era branco, tratar-me de mentiroso?"
-"Ele era vermelho, ou pensas que sou cego?"

Cada um dos amigos tinha razão e ambos estavam furioso da desconfiança
do outro.
Irritados, eles agarraram-se e começaram a bater-se até matarem-se a
golpes de enxada.
Èsù estava vingado!
Isto não teria acontecido se as oferendas a Èsù não tivessem sido
negligenciadas.
Pois Èsù pode ser o mais benevolente dos òrìsà se é tratado com
consideração e generosidade.

VI
Conta-se que Aluman estava desesperado com uma grande seca.
Seus campos estavam secos e a chuva não caia.
As rãs choravam de tanta sede e os rios estavam cobertos de folhas
mortas, caidas das árvores.
Nenhum òrìsà invocado escutou suas queixas e gemidos.
Aluman decidiu, então, oferecer a Èsù grandes pedaços de carne de bode.
Èsù comeu com apetite desta excelente oferenda.
Só que Aluman havia temperado a carne com um molho muito apimentado.
Èsù teve sede.
Uma sede tão grande que toda a água de todas as jarras que ele tinha em
casa, e que tinham, em suas casas, os vizinhos, não foi suficiente para
matar sua sede!
Èsù foi á torneira da chuva e abriu-a sem pena.
A chuva caiu.
Ela caiu de dia, ela caiu de noite.
Ela caiu no dia seguinte e no dia depois, sem parar.
Os campos de Aluman tornaram-se verdes.
Todos os vizinhos de Aluman cantaram sua glória:

"Joro, jara, joro Aluman,
Dono dos dendezeiros, cujos cachos são abundantes;
Joro, jara, joro Aluman,
Dono dos campos de milho, cujas espigas são pesadas!
Joro, jara, joro Aluman,
Dono dos campos de feijão, inhame e mandioca!
Joro, jara, joro Aluman!"

E as rãzinhas gargarejavam e coaxavam, e o rio corria velozmente para
não transbordar!
Aluman, reconhecido, ofereceu a Èsù carne de bode com o tempero no ponto
certo da pimenta.
Havia chovido bastante.
Mais, seria desastroso!
Pois, em todas as coisa, o demais é inimigo do bom.

VII
Lenda de Eshu Jelu ( Ijelu ou Ajelu )
Mandaram Eshú fazer um ebó, com o objetivo de obter fortuna rapidamente
e de forma imprevista.
Depois de oferecer o sacrifício, Exú empreendeu viagem rumo a cidade de
Ijelu.
Lá chegando, foi hospedar-se na casa de um morador qualquer da cidade,
contrariando os costumes da época, que determinavam que qualquer
estrangeiro recém chegado receberia acolhida no palácio real.
Alta madrugada, enquanto todos dormiam, Exú levantou-se sorrateiramente
e ateou fogo as palhas que serviam de telhado à construção em que estava
abrigado, depois do que, começou a gritar por socorro, produzindo enorme
alarido, o que acordou todos os moradores da localidade.
Eshú gritava e esbravejava, afirmando que o fogo, cuja origem
desconhecia, havia consumido uma enorme fortuna, que trouxera embrulhada
em seus pertences, que como muitos testemunharam, foram confiados ao
dono da casa.
Na verdade, ao chegar, Exú entregou ao seu hospedeiro um grande fardo,
dentro do qual, segundo declaração sua, havia um grande tesouro, fato
este, que foi testemunhado por enumeras pessoas do local.
Rapidamente, a notícia chegou aos ouvidos do Rei que, segundo a lei do
país deveria indemnizar a vitima de todo o prejuízo ocasionado pelo
sinistro.
Ao tomar conhecimento do grande valor da indemnização e ciente de não
possuir meios para saldá-la, o rei encontrou, como única solução,
entregar seu trono e sua coroa a Eshú, com a condição de poder
continuar, com toda sua família, residindo no palácio.
Diante da proposta, Eshú aceitou imediatamente, passando a ser deste
então o rei de Ijelu.

VIII
Sobre Eshú existem muitas lendas, mas esta demonstra bem o carácter
irreverente de Eshú:
Eshú, sabedor de que uma rainha fora abandonada pelo seu Rei (dormindo
assim em aposentos separados), procurou-a, entregou a ela uma faca e
disse que se ela desejasse ter ele de volta, deveria cortar alguns fios
da sua barba ao anoitecer quando o Rei dormisse.
Em seguida, foi à casa do Príncipe Herdeiro do trono, situada nos
arredores do palácio e disse ao Príncipe que o Rei desejava vê-lo ao
anoitecer com o seu exército.
Em seguida, foi até ao Rei e disse: "A Rainha magoada vai tentar matá-lo
à noite.
Finja que está dormindo para não morrer.
E a noite veio.
O Rei deitou-se e fingiu dormir e viu depois a Rainha aproximar uma faca
de sua garganta.
Ela queria apenas cortar um fio da barba do Rei, mas ele julgou que
seria assassinado.
O Rei desarmou-a e ambos lutaram, fazendo grande algazarra.
O Príncipe, que chegava com os seus guerreiros, escutou gritos nos
aposentos do Rei e correu para lá.
O Príncipe entrou nos aposentos e viu o Rei com a faca na mão e pensou
que ele queria matar a Rainha e empunhou a sua espada.
O Rei, vendo o Príncipe entrar no palácio armado, à noite, pensou que o
Príncipe queria matá-lo, gritou pelos seus guardas pessoais e houve uma
grande luta, seguida de um massacre generalizado.


Conta-nos uma lenda, que oxún queria muito aprender os segredos e
mistérios da arte da adivinhação, para tanto, foi procurar exú, para
aprender os princípios de tal dom.
exú, muito matreiro, disse a oxún que lhe ensinaria os segredos da
adivinhação, mas para tanto, ficaria Òsùn sobre os domínios de exú
durante sete anos, passando, lavando e arrumando a casa do mesmo.
Em troca, ele a ensinaria.
E, assim foi feito.
Durante sete anos, oxún foi aprendendo a arte da adivinhação que exú lhe
ensinava e consequentemente, cumprindo seu acordo de ajudar nos afazeres
domésticos na casa de exú.
Findando os sete anos, oxún e exú, tinham se apegado bastante pela
convivência em comum, e oxún resolveu ficar em companhia desse oríxa.
Em um belo dia, shangó que passava pelas propriedades de exú, avistou
aquela linda donzela que penteava seus lindos cabelos na margem de um
rio e, de pronto agrado, foi declarar sua grande admiração para com
oxún.
Foi-se a tal ponto que shangó, viu-se completamente apaixonado por aquela
linda mulher, e perguntou se não gostaria de morar em sua companhia no
seu lindo castelo na cidade de Oyó.
oxún rejeitou o convite, pois lhe fazia muito bem a companhia de exú.
shangó então, irado por ter sido contrariado, sequestrou oxún e levou-a
em sua companhia, aprisionando-a na masmorra de seu castelo.
exú, logo de imediato sentiu a falta de sua companheira e saiu a
procurar, por todas as regiões, pelos quatro cantos do mundo, sua doce
pupila de anos de convivência.
Chegando nas terras de Shangó, exú foi surpreendido por um canto triste e
melancólico que vinha da direção do palácio do Rei de Oyó, da mais alta
torre.
Lá estava oxún, triste e a chorar por sua prisão e permanência na cidade
do Rei.
exú, esperto e matreiro, procurou  ajuda de orúmilá, que de pronto
agrado lhe cedeu uma poção de transformação para oxún fugir dos domínios
de shangó.
exú, através da magia, pôde fazer chegar às mãos de sua companheira a
tal poção.
oxún tomou de um só gole a poção mágica e transformou-se numa linda
pomba dourada, que voou e pode então retornar em companhia de exú para a
sua morada.
fim

Como exú tornou-se Òsijè-Ebó
Essa história revela o nascimento do 17odú, como e de onde nasceu
osetùwá, em decorrência, veremos a analise através de como exú se tornou
exú osijè-Ebó, o transportador e encarregado de encaminhar as oferendas
entre a terra e o orun.
Quem deveria consultar o porta-voz-principal-do-culto-de-Ifá; a nuvem
está pendurada por cima da terra...
Bábálàwó dos tempos imemoriais;
Os "siris" estão no rio; a marca do dedo requer Yéréosún (pó sagrado de
Ifá).
Estes foram os Bábálàwó que jogaram Ifá para os quatrocentos Irúnmolè,
senhores do lado direito, e jogaram Ifá para os duzentos malè, senhores
do lado esquerdo.
E jogaram Ifá para Òsun, que tem uma coroa toda trabalhada de contas, no
dia em que ele (Òsetùá) veio a ser o décimo sétimo dos Irùnmolè que
vieram ao mundo, quando Òlódumàrè enviou os òrìsà, os dezesseis, ao
mundo, para que viessem criar e estabelecer a terra.
E vieram verdadeiramente nessa época.
As coisas que Òlódumàrè lhes ensinou nos espaços do òrun constituíram
nos pílares de fundação que sustentam a terra para a existência de todos
os seres humanos e de todos os ebora.
Olódumàrè lhes ensinou que quando alcançassem a terra, deveriam abrir
uma clareira na floresta, consagrando-a de Orò, o Igbó Orò.
Deveriam abrir uma clareira na floresta, consagrando-a a Eégún, o Igbó
Eégún, que seria chamado Igbó Òpá.
Disse que deveriam abrir uma clareira na floresta consagrando-a a Odù
Ifá, o Igbó Odù, onde iriam consultar o oráculo a respeito das pessoas.
Disse ele que deveriam abrir um caminho para os Òrìsà e chamar esse
lugar de Igbó Òrìsà, floresta para adorar os òrìsà.
Olódumàrè lhes ensinou a maneira como deveriam resolver os problemas de
fundação (assentamento) e adoração dos ojóbo (lugares de adoração) e
como fariam as oferendas para que não houvesse morte prematura, nem
esterilidade, nem infecundidade, que não houvesse perda, nem vida
paupérrima, não houvesse nada de tudo isso sobre a terra.
Para que as doenças sem razão não lhes sobrevivessem, que nenhuma
maldição caísse sobre eles, que a destruição e a desgraça não se
abatessem sobre eles.
Olódumàrè ensinou aos dezasseis òrìsà o que eles deveriam realizar para
evitar todas as coisas.
Ele os delegou e enviou à terra, a fim de executarem tudo isso.
Quando vieram ao òde àiyé, a terra, fundaram fielmente na floresta o
lugar de adoração de Orò, o Igbá Orò. Fundaram na floresta o lugar de
adoração de Eégún. Fundaram na floresta o lugar de adoração de Ifá que
chamamos Igbódù.
Também abriram um caminho para os òrìsà, que chamamos igbóòòsa.
Executaram todos esses programas visando a ordem.
Se alguém estava doente, ele ia consultar Ifá ao pé de Òrúnmìlá.
Se acontecia que Eégún poderia salvá-lo, dir-lho-iam.
Seria conduzido ao lugar de adoração na floresta de Eégún ao
Igbó-Igbàlè, para que ele fizesse uma oferenda para Egúngún.
Talvez que um de seus ancestrais devesse ser invocado como Eégún, para
que o adorasse, a fim de que esse Eégún o protegesse.
Se havia uma mulher estéril, Ifá seria consultado, a respeito dela, a
fim de que Orúnmìlà pudesse indicar-lhe a decoação de Òsun, que ela
deveria tomar.
Se havia alguém que estava levando uma vida de miséria, Orúnmìlà
consultaria Ifá, a respeito dele.
Poderia ser que Orò estivesse associado à sua própria entidade criadora.
Orúnmìlà diria a essa pessoa que é a Orò que ela devia adorar.
E ela seria conduzida à floresta de Orò.
Eles seguiram essa prática durante muito tempo.
Enquanto realizavam as diversas oferendas, eles não chamavam Òsun.
Cada vez que iam à floresta de Eégún, ou à floresta de Orò, ou à
floresta de Ifá, ou à floresta de Òòsà, a seu retorno, os animais que
eles tinham abatido, fossem cabras, fossem carneiros, fossem ovelhas,
fossem aves, entregavam-nos a Òsun para que ela os cozinhasse.
Preveniram-na que quando ela acabasse de preparar os alimentos, não
devia comer nenhum pouco, porque deviam ser levados aos Malè, lá onde as
oferendas são feitas.
Òsun começou a usar o poder das mães ancestrais - àse Iyá-mi - e a
estender sobre tudo o que ela fazia esse poder de Iyá-mi-Àjé, que
tornava tudo inútil.
Se se predissesse a alguém que ele ou ela não fosse morrer, essa pessoa
não deixava de morrer.
Se fosse proclamado que uma pessoa não sobreviveria, a pessoa
sobreviveria.
Se se previsse que uma pessoa daria à luz um filho, a pessoa tornava-se
estéril.
Um doente a quem se dissesse que ele ficaria curado não seria jamais
aliviado de sua doença.
Essas coisas ultrapassavam seu entendimento, porque o poder de Olódumàre
jamais tinha falhado.
Tudo que Olódumàre lhes havia ensinado eles o aplicavam, mas nada dava
resultado.
Que era preciso fazer?
Quando se congregaram numa reunião, Orúnmìlà sugeriu que, já que eles
eram incapazes de compreender o que se estava passando por seus próprios
conhecimentos, não havia outra solução senão consultar Ifá novamente.
Em consequência, Orúnmìlà trouxe seu instrumento adivinatório, depois
consultou Ifá.
Contemplou longamente a figura do Odù que apareceu e chamou esse Odù
pelo nome de òsetùá.
Ele olhou em todos os sentidos.
A partir do resultado definitivo de sua leitura, Orúnmìlà transmitiu a
resposta a todos os outros Odù-àgbà.
Estavam todos reunidos e concordaram que não havia outra solução para
todos eles, os òrìsàs-irúnmàlè, senão encontrar um homem sábio e
instruído que podesse ser enviado a Olódumàrè, para que mandasse a
solução do problema e o tipo de trabalho que devia ser feito para o
restabelecimento da ordem, a fim de que as coisas voltassem a
normalizar-se, e nada mais interferisse em seus trabalhos.
Ele, Orúnmìlà, deveria ir até a Olódumàrè.
Orúnmìlà ergueu-se.
Serviu-se de seus conhecimentos para utilizar a pimenta, serviu-se de
sua sabedoria para tomar nozes de obi, despregou seu òdùn (tecido de
ráfia) e o prendeu no seu ombro, puxou seu cajado do solo, um forte
redemoinho o levou, e ele partiu até aos vastos espaços do outro mundo
para encontrar Olódumàrè.
Foi lá que Orúnmìlà reencontrou Èsù Òdàrà.
Èsù já estava com Olódumàrè.
Èsù fazia sua narração a Olódùmarè.
Explicava que aquilo que estava estragando o trabalho deles na terra era
o fato de eles não terem convidado a pessoa que constitui a décima
sétima entre eles.
Por essa razão, ela estragava tudo, Olódumàrè compreendeu.
Assim que Orúnmìlà chegou, apresentou seus agravos a Olódumàrè.
Então Olódumàrè lhe disse que deveria ir e chamar a décima sétima pessoa
entre eles e levá-la a participar de todos os sacrifícios a serem
oferecidos.
Porque, além disso, não havia nenhum outro conhecimento que Ele lhes
pudesse ensinar senão as coisas que Ele já lhes havia dito.
Quando Orúnmìlà voltou à terra, reuniu todos os òrìsà e lhes transmitiu
o resultado de sua viagem.
Chamaram Òsun e lhe disseram que ela deveria segui-los por todos os
lugares onde deveriam oferecer sacrifícios.
Mesmo na floresta de Eégún.
Òsun recusou-se: ela jamais iria com eles.
Começaram a suplicar a Òsun e ficaram prostrados um longo tempo.
Todos começaram a homenageá-la e a reverenciá-la.
Òsun os maltratava e abusava deles.
Ela maltratava Òrìsànlá, maltratava Ògún, maltratava Orúnmìlà,
maltratava Òsányín, maltratava Orànje, ela continuava a maltratar todo
mundo.
Era o sétimo dia, quando Òsun se apaziguou.
Então eles disseram que viesse.
Ela replicou que jamais iria, disse, entretanto, que era possível fazer
uma outra coisa já que todos estavam fartos dessa história.
Disse que se tratava da criança que levava no seu ventre.
Somente se eles soubessem como fazer para que ela desse à luz uma
criança do sexo masculino, isso significaria que ela permitiria então
que ele a substituísse e fosse com eles.
Se ela desse à luz uma criança do sexo feminino, podiam estar certos que
esta questão não se apagaria em sua mente.
Ficariam aí, pedaços, pedaços, pedaços.
E eles deveriam saber com certeza que esta terra pereceria; deveriam
criar uma nova.
Mas se ela desse à luz um filho homem, isso queria dizer que,
evidentemente, o próprio Olórun os tinha ajudado.
Assim apelou-se para Òrìsàlá e para todos os outros òrìsà para saber o
que deveriam fazer para que a criança fosse do sexo masculino.
Disseram que não havia outra solução a não ser que todos utilizassem o
poder - àse - que Olódumàrè tinha dado a cada um deles; cada dia
repetidamente deveriam vir, para que a criança nascesse do sexo
masculino.
Todos os dias iam colocar seu àse - seu poder - sobre a cabeça de Òsun,
dizendo o que segue:

"Você Òsun!
Homem ele deverá nascer, a criança que você traz em si!"

Todos respondiam "assim seja", dizendo "tó!" acima de sua cabeça...
Assim fizeram todos os dias, até que chegou o dia do parto de Òsun.
Ela lavou a criança.
Disseram que ela deveria permitir-lhes vê-la.
Ela respondeu "não antes de nove dias".
Quando chegou o nono dia, ela os convocou a todos.
Esse era o dia da cerimónia do nome, da qual se originaram todas as
cerimónias de dar o nome.
Mostrou-lhes a criança, e a pôs nas mãos de Òrìsàálá.
Quando Òrìsàálá olhou atentamente a criança e viu que era um menino,
gritou:

"Músò"...! (hurra...!).
Todos os outros repetiram "Músò".....!

Cada um carregou a criança, depois o abençoaram.
Disseram "somos gratos por esta criança ser um menino".
Disseram: "Que tipo de nome lhe daremos?".
Òrìsàálá disse: "Vocês todos sabem muito bem que cada dia abençoamos sua
mãe com nosso poder para que ela pudesse dar à luz uma criança do sexo
masculino, e essa criança deveria justamente chamar-se À-S-E-T-Ù-W-Á (o
poder trouxe ela a nós)"
Disseram: "Acaso você não sabe que foi o poder do àse, que colocamos
nela, que forçou essa criança a vir ao mundo, mesmo se antes ela não
queria vir à terra sob a forma de uma criança do sexo masculino?
Foi nosso poder que a trouxe à terra".
Eis por que chamaram a criança de Àsetùwà.
Quando chegou o tempo, Orúnmìlà consultou o oráculo Ifá acerca da
criança, porque todos devem conhecer sua origem e destino, colheram o
instrumento de Ifá para consultá-lo.
Eles o manipularam e o adoraram.
Era chegado o momento de consultar Ifá a respeito dele, para saberem
qual era seu Odù, para que o pudessem iniciar no culto de Ifá.
Levaram-no à floresta de Ifá, que chamamos Igbódù, onde Ifá revelaria
que Òsè e Òtùá eram seu Odù.
Este foi o resultado que ele deu a respeito da criança.
Orúnmìlà disse: "a criança que Òsè e Òtùá fizeram nascer, que antes
chamamos de Àsetùwá", disse, "chamemo-la de Òsètùá".
Foi por isso que chamaram a criança com o nome do Odù de Ifá que lhe deu
nascimento, Òsètùá.
Àsetùá era o nome que ele trazia anteriormente.
Assim, a criança participou do grupo dos outros Odù, ao ponto de ir com
eles a todos os lugares onde se faziam oferendas na terra.
Foi assim que todas as coisas que Olódùmàrè lhes tinha ensinado deixaram
de ser corrompidas.
Cada vez que proclamavam que as pessoas não morreriam, elas realmente
sobreviviam e não morriam.
Se diziam que as pessoas seriam ricas, elas tornavam-se realmente ricas.
Se diziam que a mulher estéril conceberia, ela realmente dava à luz.
A própria Òsun deu a essa criança um nome nesse dia.
Disse ela: "Osó a gerou (significando que a criança era filho do poder
mágico), porque ela mesma era uma ajé e a criança que ela gerou é um
filho homem.
Disse ela: "Akin Osò", (Akin Osò: poderoso mago; homem bravo dotado de
um grande poder sobrenatural) eis o que a criança será!
É por isso que eles chamaram Òsetùá de Akin Osò, entre todos os Odù Ifá
e entre os dezasseis òrìsà mais anciãos.
Depois eles disseram que em qualquer lugar onde os maiores se reunissem,
seria compulsório que a criança fosse um deles.
Se não pudessem encontrar o décimo sétimo membro, não poderiam chegar a
nenhuma decisão, e se dessem um conselho, não poderiam ratifica-lo.
Finalmente, aconteceu!
Sobreveio uma seca na terra.
Tudo estava seco!
Não havia nem orvalho!
Fazia três anos que tinha chovido pela última vez.
O mundo entrou em decadência.
Foi então que eles voltaram a consultar Ifá, Ifà àjàlàiyé. (aquele que
administra a terra) Quando Orúnmìlà consultou Ifá àjàlàiyé, disse que
deveriam fazer uma oferenda, um sacrifício, e preparar a oferenda de
maneira que chegasse a Olódùmàrè, para que Olódùmàrè pudesse ter piedade
da terra, e assim não virasse as costas à terra e se ocupasse dela para
eles.
Porque Olódùmàrè não se ocupava mais da terra.
Se isso continuasse, a destruição era inevitável, era iminente.
Somente se pudessem fazer a oferenda, Olódumàrè teria sempre
misericórdia deles.
Ele se lembraria deles e zelaria pelo mundo.
Foi assim que prepararam a oferenda.
Eles colocaram, uma cabra, uma ovelha, um cachorro e uma galinha, um
pombo, uma preá, um peixe, um ser humano e um touro selvagem, um pássaro
da floresta, um pássaro da savana, um animal doméstico.
Todas essas oferendas, e ainda dezesseis pequenas quartinhas cheias de
azeite de dendê que eles juntaram nesse dia.
E ovos de galinha, e dezesseis pedaços de pano branco puro.
Prepararam as oferendas apropriadas usando folhas de Ifá, que toda
oferenda deve conter.
Fizeram um grande carrego com todas as coisas.
Disseram então, que o próprio Èjì-Ogbè deveria levar essa oferenda a
Olódumàrè. Ele levou a oferenda até as portas do òrun, mas elas não lhe
foram abertas.
Èjì-Ogbè voltou à terra.
No segundo dia Òyèkú-Méji a carregou, ele voltou.
Não lhe abriram as portas.
Ìwòrí-Méji levou a oferenda, assim fizeram Òdi-Méji; Ìrosùn-Méji;
Òwórin-Méji; Òbàrà-Méji; Òkànràn-Méji; Ogúndá-Méji; Òsá-Méji; Ìká-Méji;
Òtúrúpòn-Méji; Òtúá-Méji; Ìrètè-Méji; Òsè-Méji; Òfún-Méji.
Mas não puderam passar, Olórun não abria as portas.
Assim decidiram que o décimo sétimo entre eles deveria ir e experimentar
o seu poder, antes que tivessem que reconhecer que não tinham mais
nenhum poder.
Foi assim que Òsetùá foi visitar certos Babaláwo, para que eles
consultassem o oráculo para ele.
Esses Babaláwo traziam os nomes de Vendedor-de-azeite-de-dendê e
Comprador-de-azeite-de-dendê.
Ambos esfregaram seus dedos com pedaços de cabaça.
Jogaram Ifá para Akin Osò, o filho de Enìnàre (aquela que foi colocada
na senda do bem) no dia em que ele conseguiu levar a oferenda ao
poderoso òrun.
Disseram que ele deveria fazer uma oferenda; disseram, quando ele
acabasse de fazer a oferenda, disseram, no lugar a respeito do qual ele
estava consultando Ifá, disseram, ali, ele seria coberto de honras,
disseram, sucederá que a posição que ele ali alcançasse, disseram, essa
posição seria para sempre e não desapareceria jamais.
Disseram, as honras que ele ali receberia, disseram, o respeito, seriam
intermináveis.
Disseram: "Você verá uma anciã no seu caminho", disseram, "faça-lhe o
bem".
Assim, quando Òsetùá acabou de preparar a oferenda, seis pombos, seis
galinhas com seis centavos e quando estava em seu caminho, ele encontrou
uma anciã.
Ele carregava a oferenda no caminho que levaria a Èsù, quando encontrou
essa anciã na sua rota.
Essa anciã era da época em que a existência se originou.
Disse: "Akin Osò! à casa de quem vai você hoje?
"Disse: "eu ouvi rumores a respeito de todos vocês na casa de Olófin,
que os dezesseis Odù mais idosos levaram uma oferenda ao poderoso òrun
sem sucesso".

Disse: "assim seja".
Disse: "é sua vez hoje?''
Disse: "é minha vez".
Disse: "tomou alimentos hoje?"
Respondeu ele: "eu tomei alimentos".
Disse ela "quando você chegar a seu sitio, diga-lhes que você não irá
hoje".
Disse ela: "Esses seis centavos que você me deu", Disse: "há três dias
não tinha dinheiro para comprar comida"
Disse: "diga-lhes que você não irá hoje".
Disse: "quando chegar amanhã, você não deve comer, você não deve beber
antes de chegar ali".
Disse: "você deve levar a oferenda".
Disse: "todos esses que ali foram, comeram da comida da terra, essa é a
razão por que Olórun não lhes abriu a porta!"
Quando Òsetùá voltou a casa de Oba Àjàlàiyè, todos os Odù Ifá estavam
reunidos lá.
Disseram: "você deve estar pronto agora, é sua vez hoje de levar a
oferenda ao òrun, talvez a porta seja aberta para você!
"Disse ele que estaria pronto no dia seguinte, porque não tinha sido
avisado na véspera.
Quando chegou o dia seguinte, Òsetùá, foi encontrar Èsù e lhe perguntou
o que deveria fazer.
Èsù respondeu: "Como!
Jamais pensei que você viria me avisar antes de partir".
Disse ele: "isso vai acabar hoje, eles lhe abrirão a porta!
" Perguntou ele: "Tomou algum alimento?
"Òsetùá lhe respondeu que uma anciã lhe tinha dito na véspera que ele
não devia comer absolutamente nada.
Então Òsetùá e Èsù puseram-se a caminho.
Partiram em direcção aos portões do òrun.
Quando chegaram lá, as portas já se encontravam abertas.
Quando levaram a oferenda a Olódùmarè e Ele examinou.
Olòdumarè disse: "Haaa! Você viu qual foi o último dia que choveu na
terra?!
Eu me pergunto se o mundo não foi completamente destruído. Que pode ser
encontrado lá?
"Òsetùá não podia abrir a boca para dizer qualquer coisa.
Olódùmarè lhe deu alguns "feixes" de chuva.
Reuniu, como outrora, as coisas de valor do òrun, todas as coisas
necessárias para a sobrevivência do mundo, e deu-lhas.
Disse que ele, Òsetùá, deveria retornar.
Quando deixaram a morada de Olódumarè, eis que Òsetùá perdeu um dos
"feixes" de chuva.
Então a chuva começou a cair sobre a terra.
Choveu, choveu, choveu, choveu....
Quando Òsetùá voltou ao mundo, em primeiro lugar foi ver Quiabo.
Quiabo tinha produzido vinte sementes.
Quiabo que não tinha nem duas folhas, um outro não tinha mesmo nenhuma
folha em seus ramos.
Voltou-se em direção à casa do Quiabo escarlate, Ilá Ìròkò tinha
produzido trinta sementes.
Quando chegou a casa de Yáyáá, esse havia produzido cinquenta sementes.
Foi então até à casa da palmeira de folhas exuberantes, que se
encontrava na margem do rio Awónrin Mogún.
A palmeira tinha dado nascimento a dezesseis rebentos.
Depois que a palmeira deu nascimento a dezasseis rebentos ele voltou à
casa de Oba Àjàlàiyé.
Àse se expandia e se estendia sobre a terra.
Sémen convertia-se em filhos, homens em seu leito de sofrimento se
levantavam, e todo o mundo tornou-se aprazível, tornou-se poderoso.
As novas colheitas eram trazidas dos plantios.
O inhame brotava, o milho amadurecia, a chuva continuava a cair, todos
os rios transbordavam, todo mundo era feliz.
Quando Òsetùá chegou, carregaram-no para montar num cavalo (signo de
realeza: só os mais poderosos podem-se permitir a criar ou montar
cavalos em País Yorùbá).
Estavam mesmo a ponto de levantar o cavalo do chão para mostrar até que
ponto as pessoas estavam ricas e felizes.
Estavam de tal forma contentes com ele, que o cobriram de presentes, os
que estavam em sua direita os que estavam em sua esquerda.
Começaram a saudar Òsetùá: "Você é o único que conseguiu levar a
oferenda ao òrun, a oferenda que você levou ao outro mundo era poderosa!
Disseram, "sem hesitação, rápido, aceite meu dinheiro e ajude-me a
transportar minha oferenda ao òrun! Òsetùá! Aceite rápido! Òsetùá aceite
minha oferenda!" Todos os presentes que Òsetùá recebeu, os deu todos a
Èsù Òdàrà.
Quando os deu a Èsù, Èsù disse: "Como!
"Há tanto tempo ele entregava os sacrifícios, e não houve ninguém para
retribuir-lhe a gentileza.
"Você Òsetùá! Todos os sacrifícios que eles fizerem sobre a terra, se
não os entregarem primeiro a você, para que você possa trazer a mim,
farei que as oferendas não sejam mais aceitáveis".
Eis a razão pela qual sempre que os Babaláwo fazem sacrifícios, qualquer
que seja o Odù Ifá que apareça e qualquer que seja a questão, devem
invocar Òsetùá para que envie as oferendas a Èsù.
Porque é só de sua mão que Èsù aceitará as oferendas para levá-las ao
òrun. Porque quando Èsù mesmo recebia os sacrifícios das pessoas da
terra e os entregava no lugar onde as oferendas são aceitas, eles não
demonstravam nenhum reconhecimento pelo que ele fazia por todos até o
dia em que Òsetùá teve de carregar o sacrifício e Èsù foi abrir o
caminho apropriado para o òrun, para alcançar a morada de Olódumàrè.
Quando se abriram as portas para ele.
A qualidade de gentileza que Èsù recebeu de Òsetùá era realmente muito
valiosa para ele (Èsù).
Então ele e Òsetùá decidiram combinar um acordo pelo qual todas as
oferendas que deveriam ser feitas deveriam ser-lhe enviadas por
intermédio de Òsetùá.
Foi assim que Òsetùá converteu-se no entregador de oferendas para Èsù.
Èsù Òdàrà, foi assim que ele se converteu em O portador de oferendas
para Olódumàrè, Èsù Òsijé-Ebó, no poderoso òrun.
É assim como este Itan (verso) Ifá explica, a respeito de Èsù e Òsetùá.

XI
"Exu, filho primogénito de Iemanjá com Orunmilá, o deus da adivinhação e
irmão de Ogum, Xangô e Oxóssi, era voraz e insaciável.
Conseguiu comer todos animais da aldeia em que vivia.
Depois disso, passou a comer as árvores, os pastos, tudo que via até
chegar ao mar.
Orunmilá previu então que Exu não pararia e acabaria comendo os homens,
e tudo que visse pela frente, chegando mesmo a comer o céu.
Ordenou então a Ogum que contivesse o irmão Exu a qualquer custo.
Para conseguir isto, Ogum foi obrigado a matar Exu, a fim de preservar a
terra criada e os seres humanos.
Mas mesmo depois da morte de Exu, a natureza, os pastos, as árvores, os
rios, tudo permaneceu ressecado e sem vida, doente, morrendo.
Um babalaô (representante de Orunmilá na terra) alertou Orunmilá de que
o espírito de Exu sentia fome e desejava ser saciado, ameaçando provocar
a discórdia entre os povos como vingança pelo que Orunmilá e Ogum haviam
feito. Orunmilá determinou então que em toda e qualquer oferenda que
fosse feita pelos homens a um orixá, houvesse uma parte em homenagem a
Exu, e que esta parte seria anterior a qualquer outra, para que se
mantivesse sempre satisfeito e assim possibilitasse a concórdia".

XII 
Filho de Oxalá com Yemanjá e irmão gémeo de Ogum, Elegbará sempre
aprontava para chamar a atenção, devido aos seus ciúmes.
Destemido, valente e brincalhão, adorava se envolver em tudo o que
acontecia na Terra.
Devido à sua imensa curiosidade e vontade de viver, ele andou pelos
quatro cantos do mundo, buscando descobrir todos os segredos e mistérios
que envolviam a nosso planeta.
Elegbará era um orixá que ao mesmo tempo que era amado, era muito
temido, pois já intimidava a todos com seus olhos, que eram duas bolas
de fogo.
Ao contrário de alguns orixás que ansiavam em ter um reino, fundando
nações, ele queria o mundo todo, por isto saía pelas estradas, vivendo
aventuras e angariando adoradores em todas as tribos que visitava.
Elegbará é aquele que vive no plano intermediário entre o Orum e o Aiyê.
Ele é o protector dos aventureiros, jogadores e todos aqueles que gostam
de viver.

XIII
CONTOS
O Teste de Ifá
Eleg, cafião de extrema curiosidade, vivia a andar pela Terra, tentando
descobrir todos os segredos e mistérios que existiam no planeta.
Em nome desta ânsia do saber, pediu a seu irmão gémeo, Ogun, que
cuidasse de sua tribo.
Este, no entanto, recusou-se, argumentando que também não dava a devida
atenção à sua própria tribo.
Por fim os dois deixaram suas tribos sob os cuidados de sua mãe,
Yemanjá, pois ela sempre dava atenção a quem quer que fosse...
O sol estava no ponto mais alto do céu, fustigando a vegetação, enquanto
uma leve e quente brisa soprava o cheiro da mata quase seca.
A cada passo, Eleg podia sentir o chão seco e a poeira colar em seus
calcanhares suados, enquanto pensava em que caminho tomaria, para
encontrar algo que saciasse sua sede de conhecimento.
Embora parecesse absorto em suas divagações, estava sempre alerta a tudo
o que acontecia à sua volta, tanto que podia ouvir o bater das asas de
uma borboleta, ou o abrir e fechar dos olhos de um macaco à longa
distância e distinguir os sons de tal forma, que podia prestar atenção a
tudo.
Devido a esta sua capacidade, todos o comparavam ao vento, dizendo que
ele estava em todos os lugares.
Com sua apurada audição, ele sentiu a aproximação de uma desembestada
manada de rinocerontes ao longe.
Isto se transformou em uma distracção, pois acompanhava com os olhos a
corrida desorientada dos bichos que, por onde passavam, espantavam
pássaros, derrubavam árvores e atropelavam outros animais.
De repente a manada virou-se em sua direcção e ele, sem querer influir
no arbítrio dos rinocerontes, decidiu sair de seu caminho.
Num salto rápido alcançou o topo de uma grande pedra que estava ali
perto, saindo da frente dos animais que levantaram uma imensa nuvem de
poeira, que o deixaram sem visão por um instante.
Do alto da rocha, assim que se dissipou a nuvem poeirenta, ele divisou
ao longe, na vasta savana, um ancião deitado à sombra de um arbusto,
parecendo estar dormindo, dada sua inércia.
Não precisou pensar muito para ver que a manada estava na direção do
pobre velho, que poderia machucar-se muito.
Vendo aquilo, Eleg sentiu-se condoído, não lhe agradava a idéia de que
alguém pudesse ter um fim tão trágico.
Tentando alertar o ancião, juntou todo o ar que seu pulmão pudesse
suportar e gritou.
No entanto o velho nem sequer se mexeu.
Sem atinar se o barulho da manada abafara o seu berro, pensou que o
homem pudesse estar ali desmaiado ou doente.
Eleg sentiu em seu ser que deveria ajudá-lo.
Usando de sua fantástica velocidade, ele correu pela savana e, quando
alcançou a manada, pulou e andou por sobre o lombo dos rinocerontes num
malabarismo fantástico, vencendo um a um.
Como tinha o poder de encantar qualquer animal, destemido, ele pulou à
frente da manada, tomou uma distância segura, ergueu as mãos ao céu num
gesto magistral e exalou todo seu poder.
Um a um os animais paravam, deitavam-se e caiam em um profundo sono.
Toda savana testemunhou um inesquecível espectáculo, tendo como produto
final, o que parecia ser um imenso tapete de rinocerontes.
Tal foi a força do encanto, que fez calar tudo ao redor.
Se uma mosca houvera passado por ali, com certeza cairia desfalecida
pelo chão árido.
Depois de afastar o perigo, Eleg, cansado pelo grande desprendimento de
energia, virou-se e andou em direcção ao ancião para ver o que
acontecera.
Quando estava chegando perto, pôde ver o velho levantar-se, tirando o pó
das rotas vestes.
Era um ser curvado, de movimentos lentos, que se apoiava num carcomido
cajado.
Com os olhos quase cobertos pelas pálpebras, fitou seu benfeitor com
candura e um sorriso trémulo, curvando-se em sinal de agradecimento.
O viril cafião pensou que era algum tribal que fora abandonado à sorte
pelos seus patrícios.
Curioso Eleg indignado indagou:
- Quem é você?
O que faz aí, bem à frente de uma desembestada manada, preste a ser
demolido por completo?
- Quer saber quem sou?
Perguntou o velho sorridente, mostrando apenas dois dentes na boca, e
caiu no chão sobre si, cobrindo-se com seus trapos, parecendo querer
esconder-se.
De repente, uma imensa luz despedaçou os trapos como se fossem de vidro.
Neste momento surgiu à frente do cafião um ser que brilhava como o Sol,
que chegou a ofuscar seus olhos de fogo.
Quando se acostumou com o brilho, ele viu que se tratava de Ifá, um ser
de luz, enviado de Olorum na Terra, encarregado de ouvir a todos aqueles
que buscam ajuda, detentor de segredos e mistérios.
Perplexo, Eleg perguntou:
- O que aconteceu, para você, um orixá, materializado como um velho,
estar caído à sombra de um arbusto, esperando ser pisoteado pelos
rinocerontes - neste momento o cafião percebeu que não estava na savana,
mas numa floresta à beira de um rio, o ar era húmido e com um
maravilhoso cheiro de verde.
O carcomido cajado cintilava e tinha na ponta uma reluzente bola de
cristal, que rodava sem parar em volta de seu próprio eixo.
Ela era como a íris do grande olho que se formou no ponto mais alto do
cajado.
Ifá com voz solene, que parecia ecoar pela floresta, pacientemente
explicou:
- Isto tudo se tratava de um teste, pois, entre os orixás corre a
história de que você não era capaz de ajudar ninguém, sem querer algo em
troca, uma vez que só pensava em si mesmo e em suas descobertas.
Mas vejo que todos estão errados, e hoje vi com meus próprios olhos que
a bondade pode ser despertada em você, uma vez que correu em auxílio de
um velho pobre e aparentemente sem nada para dar em troca.
Frente a isto, quero lhe propor o seguinte: como sei da sua curiosidade,
eu lhe darei um modo de saber o presente, o passado e o futuro - Ifá
debruçou-se sobre o rio, pegou dentre as águas um punhado de conchas e
prosseguiu - tome, estes são meus olhos, dou-lhe estes búzios, um jogo
através do qual saberá tudo o que ocorre pelas tribos, com a condição de
ajudar a todos que precisem de seu auxílio.
- Eu aceito seu presente - Eleg pegou das mãos de Ifá as conchas,
enquanto as duas bolas de fogo, seus olhos, brilhavam como nunca,
parecendo estarem hipnotizados, e continuou - embora não possa afirmar
que correrei atrás de ninguém para ajudar, prometo auxiliar a todos que
a mim vierem.
Assim que terminou de falar, ele levantou os olhos e não viu nem
floresta com rio, nem o ser de luz, que havia desaparecido como se
tivesse evaporado no ar, encontrava-se à sombra de um arbusto no meio da
seca savana.
Eleg sentiu um misto de êxtase e torpor, ao constatar que seu esforço
não fora em vão e ao ver que um sentimento tão simples pudesse lhe
render tão precioso presente.
Essas sensações cruzaram com ele todo o caminho de volta para sua gruta,
onde guardou e sempre consultava seu jogo, para saber os acontecimentos
e fofocas de todas tribos, procurando manter em segredo seu valioso
presente.
Eleg Descobre o Ouro
Eleg nunca gostou de ficar parado num só lugar, seu prazer era andar
pelas tribos, chamar a atenção de todos, contando suas aventuras (sempre
aumentando um pouquinho) e gabando-se por suas descobertas.
Muitas vezes causava intrigas, fazendo o leva-e-traz, pois tinha acesso
livre a todos os reinos.
Embora fosse brincalhão (deleitava-se ao pregar uma peça em alguém),
gostava de estar sempre bem com todos, pois era muito político, fazia de
tudo para agradar.
Muitos o estimavam, era o orixá com maior número de adoradores, ele
conquistava a admiração de todos, fosse com suas previsões, dadas pelo
seu jogo de búzios, fosse com uma boa conversa: falava do que sabia com
eloquência, e do que não sabia, sofismava com elegância, quando era
surpreendido num assunto que pouco sabia, mudava de assunto tão
rapidamente que ninguém percebia.
Sua chegada nas tribos era motivo de festa, as crianças saiam
saltitantes de moradia em moradia, anunciando entre palmas e gritos.
As pessoas se atropelavam e o circundavam, tentando tocá-lo.
Quando ele parava no meio da aldeia, todos se sentavam a sua volta,
ouvindo-o contar as notícias e suas peripécias, que provocam risos e
veneração.
Eleg era sempre portador de uma novidade, trazendo sob suas vestes algo
inusitado, curiosidades que arrancavam urros de espanto dos
espectadores.
Quando percebia que as pessoas se cansavam de seus pertences e suas
histórias e não lhe davam a devida atenção, ou ele aprontava uma
pilhéria, ou entediava-se e ia embora, procurando obter a esperada
consideração em outra tribo.
Numa dessas visitas a uma tribo, enquanto Eleg contava suas aventuras
com maestria, um forte tremor de terra fez com que todos os espectadores
debandassem entre gritos desesperados, deixando o narrador sozinho no
meio da aldeia.
Após o rápido terremoto, o silêncio era tão grande que se podia ouvir o
pensamento do cafião.
Passou por sua mente a vontade de descobrir o que sucedera.
Era Odudua, a mãe natureza, demonstrando sua ira, devido à grande
devastação que ocorrera numa disputa entre tribos, onde uma botou fogo
na vegetação da outra, em busca de enfraquecimento do inimigo.
O incêndio atingiu grande parte de uma floresta, dizimando a fauna e a
flora da região.
Perplexo, ele levantou-se como quem esperava o pior, pois o silêncio era
um mau presságio.
Quando ele ameaçou caminhar, um novo tremor sucedeu, desta vez, mais
forte e duradouro, as pedras rolaram e os gritos ecoaram pela aldeia,
grandes árvores caíam por terra, arrastando consigo séculos de história.
Os pássaros abandonavam as árvores em revoada, os macacos pulavam de
galho em galho em total desespero.
Aos pés de Eleg o chão começou a se abrir, formando uma imensa fenda,
fazendo a terra sangrar, mostrando a lava incandescente.
Quando a ferida começou a cuspir bolas de fogo, o chão parou de tremer.
O fogo não abalou a confiança dele, que mesmo em meio à grande e espessa
fumaça, avistou um material que brilhava como a luz do Sol.
Dando vazão à sua curiosidade, chegou perto da lava, uma vez que ele era
o senhor do fogo e dos vulcões, o calor não lhe fez mal algum.
Com as mãos colheu o material.
Tratava-se de uma esfera de brilho estonteante, cuja cor dourada chegava
a ofuscar seus olhos, que eram duas bolas de fogo.
Frente à infinita beleza, ele decidiu apossar-se da bola brilhante no
intuito de juntá-la às suas outras descobertas, que ficavam escondidas
em sua gruta, cujo caminho só ele conhecia.
A fumaça e a lava já se dissipara, quando o cafião, vislumbrando seu
achado, dirigia-se para fora da aldeia.
Tomado por um grande delírio, pôde ouvir alguém atrás de si.
Era o chefe da aldeia, correndo em sua direcção, tropeçando, gritando
aflito:
- Oh! Senhor das peripécias, eu suplico, não carregues nosso precioso
objeto, pois nele está o sustento de nossa aldeia!
Se tirá-la de nós, tudo à nossa volta ruirá!
Demonstrando profundo desdém, o viril orixá abandonou o local, tomado
pela energia da valiosa esfera.
À medida que Eleg se afastava, o que havia sobrado da aldeia caía por
terra, dizimando todos que ali estavam, transformando tudo em pó e
profundo silêncio.
A Grande Festa
De tempos em tempos, todas as tribos dos orixás se reuniam, para fazer a
troca de energia entre eles.
Eleg, como era muito exibido, achou por bem levar sua última descoberta,
para mostrá-la a todos.
Oxóssi, o grande caçador, trouxe um grande animal de infinita beleza,
para alimentar a todos, ofertou frutas e legumes em enormes alguidares.
Ogun mostrou a todos a nova arma que forjara e logo tratou de abater o
bicho trazido pelo caçador.
Obá e Oxum, que sempre colocavam à prova suas habilidades culinárias,
ofereciam as mais diversas iguarias.
Omulu, com toda sua humildade, contou sobre as novas doenças que
conheceu em suas últimas andanças.
Ossayn, do meio da mata, ensinou sobre novas ervas de cura.
Cada orixá tinha uma novidade para oferecer aos outros.
A certa altura da festa, o Eleg tirou de seu axó um objeto que parecia
ter luz própria e ergueu-o sobre sua cabeça, neste momento Ogum e Oxalá
pararam de falar, Oxóssi fez calar os atabaques, Iansã, Yemanjá e Oxum
pararam de dançar, Xangô, Obá e Omulu deixaram de comer, Nanã, Oxumaré e
Ewá abandonaram suas tendas, todos deixaram o que estavam fazendo para
admirarem o maravilhoso artefacto.
Percebendo a estupefacção de todos os orixás e suas tribos frente à sua
descoberta, Eleg encheu-se de satisfação e desfilou entre os presentes,
para que todos pudessem ver de perto a esfera dourada, sem deixar
ninguém tocá-la.
A cada comentário, a cada sussurro de surpresa, ele girava num pé só e
delirava, a energia que sentia em seu corpo podia fazê-lo levitar.
- Vejam - sussurravam alguns presentes - Eleg pegou um pedaço de Oorum!
- Que objecto maravilhoso!
Diziam os mais estupefactos - que provas teve ele que vencer para
conseguir tal artefato?
Esses eram alguns dos comentários que corriam entre os mais
entusiasmados.
Como ele tinha os ouvidos apurados, gostou da idéia, viu nisto uma forma
de aumentar sua glória.
Frente aos ansiosos pedidos de lhes revelar o que ele havia feito para
obter a esfera dourada ele disse com soberba.
- Cansado de explorar a Terra, que parece já não ter mistérios que
alimentem minha ânsia do saber, descobri um modo de ir a outros lugares
do universo (mentira), perambulando pelos astros passei pelo Oorum, de
onde tive a idéia de tirar este pedaço do astro rei, para provar a minha
bravura.
Depois do instante de silêncio que sucedeu à narrativa, um alarido tomou
conta do lugar, enquanto uns duvidavam da sua história, outros se
entregavam à sua inigualável intrepidez, fazendo-lhe os mais diversos
elogios.
Oxum, filha de Oorum e a mais bela yabá de toda Terra, sentiu suas
pernas tremerem e sua boca secar, dirigindo-se para sua tenda, pensou
consigo:
"Ah! Como meu querido pai pôde consentir que este esnobe o visitasse,
sendo que eu, sua querida filha, nunca pude sequer fitá-lo daqui?
Como este convencido se atreve a pegar um pedaço de meu pai?"
Durante um bom tempo ela permaneceu calada, sua ira confundia-se com sua
tristeza.
Quando sua mente parou de pensar por um instante na audácia de Eleg, ela
atinou um plano: decidiu ter o objecto que acreditava ser um pedaço de
Oorum, fazendo-se valer de sua beleza para seduzir o presunçoso cafião.
A Sedução de Oxum
A bela yabá, sabendo do profundo amor que o fanfarrão tinha por ela (o
mesmo fizera questão de espalhar pelos quatro cantos do mundo, dizendo
que ela um dia seria dele), foi com suas mucamas para a tenda de Eleg,
ofertando-lhe um vinho, cuja safra deixava inveja ao néctar dos deuses.
Ele não escondeu a surpresa e a satisfação de ter sua amada procurando
sua companhia.
De um salto ordenou aos convivas que se afastassem, alegando ter que dar
atenção à yabá.
Convidou-a educadamente a dividir seu aconchego, oferecendo uma
deliciosa carne provinda da caça de Oxóssi.
Deixando-se levar por seus prazeres, Eleg entregou-se totalmente aos
encantos de Oxum, sem tirar nenhum momento os olhos da bela yabá, cujas
madeixas eram enfeitadas com flores amarelas.
Para agradá-la ainda mais, pediu a seus serviçais que enfeitassem sua
tenda com tecidos amarelos que eram a cor preferida dela.
Oxum dócil e sensual, apesar de ter várias mucamas, tomava para si a
tarefa de colocar uvas e os nacos de carne mal passada na boca do
cafião, que a cada mastigada gemia de prazer, que com certeza não eram
simplesmente pelo maravilhoso gosto do alimento.
De quando em quando ele jogava-se no colo dela com a boca aberta,
apontando para a quartinha de vinho, fingindo uma incontrolável
impotência.
Ela, por sua vez, graciosamente pegava e virava o recipiente com tal
precisão que nenhuma gota caía.
Depois de saborear o gole de tão sagrado líquido, uivava feito um animal
no cio, chacoalhando os braços e a cabeça, deixando o suor do seu corpo
espalhar-se pelo aposento, às vezes chegava a levantar-se e saltar,
deixando-se levar pelo ímpeto do êxtase.
Nesta ora bastava a iabá tocar-lhe docilmente, para amansá-lo e fazer
com que deitasse de novo ao seu lado.
Difícil saber qual prazer era maior: por um lado Eleg gozava o prazer de
ter a seu lado uma yabá, cuja beleza encantava a qualquer ser, e ele
nunca pôde chegar tão perto dela, mal podia acreditar no que acontecia,
por outro lado Oxum deleitava-se ao ter sob seu domínio tão viril e
indomável cafião, cuja sagacidade e disposição todos invejavam.
Depois de muito beber, ele se entregou por inteiro aos encantos da yabá,
que, com toda sua infinita sedução, tentava convencê-lo a mostrar-lhe a
caverna onde ele habitava.
Entorpecido pelo vinho e pela beleza dela, concordou em revelar esse
grande segredo.
Depois da festa, Eleg dispensou os serviçais e saiu pela mata carregando
Oxum nos braços, cumprindo o que prometera.
O caminho era longo e, mesmo sob os afagos infalíveis dela, ele ia
pensando no que estava prestes a fazer, se valeria a pena ou não.
Chegando perto de sua gruta, Eleg deu ouvido à sua intuição e fez um
encanto, colocando a yabá para dormir, para ela não saber onde era a
entrada de sua morada. Assim não haveria arrependimento de forma alguma.
Oxum na Gruta de Eleg
Oxum acordou num lugar iluminado por labaredas que saiam de fendas no
chão.
Estava deitada sobre macias peles de animais que não dava para precisar
quais eram.
Sobre sua cabeça havia centenas de estalactites no tecto da ampla
caverna, cuja cor estava perto do laranja ou vermelho, dependendo da
oscilação das chamas.
Quando se levantou, observou que aos pés dos aposentos uma cesta repleta
de mamões, seus frutos predilectos.
Num giro pelo lugar pôde ver a amplitude da caverna que era repleta de
aberturas laterais, eram como portas que poderiam dar em qualquer lugar.
Indignada começou a rodar em volta de si e gritar desesperada:
- Eleg, Eleg, onde está você?
Por que me abandonou aqui?
Sua voz ecoava pela caverna fazendo parecer que havia muitas pessoas lá
arremedando sua voz.
Isto irritava-a, fazendo com que ela colocasse as mãos nos ouvidos e
ajoelhar-se no chão.
Depois de muito choro e lamentos, decidiu calar-se.
Quando se levantou para arriscar entrar em uma das aberturas da caverna,
ouviu um barulho que parecia ser de alguém que chegava.
De uma das aberturas atrás dela surgiu sorridente Eleg, perguntando
docilmente:
- Oh! Minha amada, já acordou?
Desculpe-me a ausência, precisei retirar-me por um instante apenas para
guardar o meu pedaço de Oorum.
- Você não cumpriu o combinado!
Trazia-me no colo e, de repente, acordei aqui sozinha, sem nem saber
como aqui cheguei! Disse ela furiosa.
- Nada posso fazer, se no meio do caminho você adormeceu.
Mas não vejo onde não cumpri o combinado, já que você agora conhece
minha caverna.
Não se alegra ao saber que é a única a conhecê-la?
Disse ele astutamente deitando-se sobre as peles.
Vendo a possibilidade de seu plano ir por água abaixo, ela se jogou ao
chão e começou a chorar.
Comovido pelos soluços da yabá, ele chegou perto e lhe acariciou os
cabelos, tirando deles as pétalas das flores soltas.
Percebendo a comoção dele, ela chorava mais e mais.
- Não é necessário tal pranto, o que fiz eu de errado?
Perguntou Eleg pacientemente.
- Nada - disse ela, enxugando as lágrimas do rosto com as mãos - eu que
sou uma tola.
Como posso estar aqui aos prantos na presença de tão viril e belo orixá?
- Então por que chora?
Disse ele totalmente embebido em sua vaidade.
- É que eu gostaria de tocar o pedaço do Sol, uma vez que é parte dos
meus pais, que há muito me deixaram em nome de iluminar o mundo em que
vivo.
Sinto que isto me faria matar um pouco da saudade que sinto deles.
- Sinto seu pesar, mas acredito que tal objecto só aumentará a falta que
sente!Disse Eleg, procurando esquivar-se.
- Engano seu, eu sei que será bom para mim! Ela insistiu.
- Bom! Então eu vou buscar! Concluiu virando-se em direcção à abertura
de onde saíra há pouco.
- Não! Espere! Eu não vou ficar aqui só de novo! Falou, correndo atrás
do cafião.
- Lamento, mas não poderá ir até minha gruta secreta! Eleg mostrou-se
arredio.
- Por que não quer que eu vá até sua câmara secreta, se nem sequer sei
chegar até aqui?
Eleg pensou por um momento e caiu diante do argumento da yabá,
concordando que ela não oferecia perigo nenhum.
Os dois iam pelas grutas, enquanto Eleg, esperto, entrava em várias
aberturas, procurando deixá-la desnorteada.
Oxum, usando de toda sua sagacidade, foi jogando pelo caminho as pétalas
das flores que estavam em suas melenas, com o máximo cuidado, para ele
não perceber.
Quando chegou à câmara secreta de Eleg, ela ficou maravilhada, ao ver
tantos pertences valiosos, e não economizou elogios ao cafião, que
parecia desmanchar-se a cada palavra.
Ele se abaixou e pegou a bola brilhante e entregou nas mãos dela.
Uma sensação esquisita tomou conta da yabá.
Tal objecto mostrou que exercia uma imensa força sobre seu ser, um forte
desejo de ter o pedaço a qualquer custo, seus olhos brilhavam e
espelhavam os pensamentos maléficos que passavam pela sua mente, fazendo
com que tirasse os pés do chão por um instante, várias idéias sem nexo
boiavam na sua cabeça, o brilho da esfera fazia sua cabeça girar,
girar...
- Oxum! Oxum! Este é o presente que ganhei de Ifá, o jogo de búzios -
disse Eleg entregando a ela as conchas.
As palavras dele trouxeram-na de novo à realidade.
Ela, como se tivesse acordado de um sonho, entregou-lhe a bola com uma
imensa dor e pegou o jogo.
- Veja! É através deste jogo que fico sabendo presente, passado e
futuro...
- Maravilhoso! Disse ela, pegando as conchas e comprimindo-as ao corpo
como se quisesse que elas atravessassem sua pele, num estado hipnótico.
Chegou a pensar em Ifá, seu tio, com ressentimento.
Enquanto Eleg mostrava seus tesouros, ela não parava de pensar em como
adquirir a bola dourada, às vezes soltava um elogio furtivo, tentando
disfarçar seu intento.
Depois de saciada a curiosidade dela, ele a levou para os seus
aposentos, para eles se deleitarem.
Sem esquecer seu plano, a bela yabá entregou-se a um grande momento de
amor, fazendo o cafião suar, uivar e gastar sua energia, falando falsas
palavras de amor eterno com as quais ele delirava.
Depois de muito tempo, o grande vigor dele caiu por terra.
Ela o levara à exaustão, fazendo-o cair em sono profundo.
Quando teve a certa de que ele não se levantaria, ela, seguindo as
pétalas pelo chão, correu para o esconderijo na intenção de resgatar o
objeto que, para ela, pertencia-lhe por direito.
Chegando à câmara secreta ela se abaixou para pegar a esfera, viu os
búzios e decidiu levá-los também.
Rapidamente ela pegou um pedaço de seu axó, fez uma trouxa onde ocultou
os objetos e silenciosamente voltou para os aposentos.
Na ânsia de obter o que queria, ela se esqueceu de como faria para sair
dali.
Olhava para as aberturas na caverna e começou a sentir-se tonta.
De repente prestou a atenção nas labaredas que saiam do chão e constatou
que de uma das aberturas soprava um vento quase imperceptível.
Usando toda sua intuição, foi seguindo a brisa pelas aberturas da
caverna.
Ao despertar todo amoroso, ele procurou Oxum pelos seus aposentos na
intenção de elogiá-la pela grande noite de amor.
Quando descobriu que ela não estava, ele correu para a sua câmara
secreta, lá deu falta de seus bens preciosos.
Cuspindo fogo por toda caverna, Eleg decidiu vingar-se.
Foi correndo e vociferando pela gruta em direcção à saída.
Oxum já estava quase saindo, quando ouviu o eco dos berros de Eleg.
Procurando preservar-se, ela correu sem olhar para trás.
Ele saiu da caverna emanando fogo para todos os lados, fazendo a
floresta arder em fogo.
Quando avistou um rio, ela mergulhou em suas águas, para fugir das
chamas.
A Busca de Eleg
Oxum, sabendo que Eleg não descansaria enquanto não a encontrasse, saiu
espalhando, pelas tribos por onde passava, que resgatara os bens
valiosos que lhe foram roubados e que ele havia mentido quando disse a
todos que eram suas descobertas.
Por conta das peripécias dele e sua grande capacidade de inventar
histórias, todos tenderam a acreditar na yabá, dando-lhe cobertura na
fuga, mas sem lhe dar guarida, por temerem perder a simpatia dele.
Diante da dificuldade em se esconder, ela decidiu pedir abrigo a Oxóssi,
seu grande amor.
Depois de ouvir a versão dela, ele decidiu abrigá-la em sua mata.
O caçador tinha consciência de que o sagaz cafião não a incomodaria,
enquanto estivesse por perto, mas sabia que, quando fosse caçar, nada
deteria o furioso orixá.
Assim aconselhou Oxum a procurar Yemanjá, cujo reino ficava no fundo do
mar.
Depois de uma longa busca, Eleg ficou sabendo onde a deusa da beleza
estava escondida.
Inconformado, ele foi ao reino de sua mãe, com a certeza de que ela o
ouviria a ponto de fazer Oxum devolver-lhe seus bens preciosos.
Ele foi bem recebido, mas Yemanjá parecia ressabiada com a presença
dele.
- Minha mãe! Disse ele com reverência.
- Meu filho! O que o traz por estes lados? - indagou tentando disfarçar.
- Minha mãe deve saber o motivo de minha inusitada visita, já que não
costumo vir a seu belo reino. - Eleg ironizou.
- Bom! Já deveria saber que não viria aqui simplesmente para me ver.
- Já sei que Oxum deve ter contado sua versão, fiquei sabendo em algumas
tribos por onde passei.
Espero que pelo menos a senhora minha mãe acredite na minha versão -
falou curvando-se em respeito à benevolente yabá.
- Como posso acreditar em suas histórias, sendo que já mentiu tanto para
todos? Quem pode me assegurar que conta a verdade agora? - desafiou
Yemanjá.
- Como pode preterir seu próprio filho, para proteger uma yabá tão
perversa!
Ele levantou, soltando chispas pelos olhos, fincou o pé no chão,
levantou seu tridente e continuou furioso.
- Minha mãe pode escondê-la por enquanto, mas não sossegarei enquanto
não obtiver o que por direito me pertence!
Ele virou-se de costas para Yemanjá, mostrando indignação e desrespeito,
e saiu rapidamente, deixando suas pegadas ardendo em fogo no caminho que
tomou para sair do reino.
À medida que andava, Eleg sentia a fúria transformar-se em consternação:
como sua mãe escolheu proteger Oxum que o roubara?
Oxalá e Xangô vinham conversando animados pelo caminho.
Andavam em direção ao reino de Yemanjá.
Falavam sobre a evolução dos reinos, as guerras e as doenças.
Às vezes riam, às vezes calavam-se, buscando levantar novos assuntos
para deliberarem.
Foi num intervalo destes que Xangô avistou mais à frente alguém
caminhando cabisbaixo.
- Olhe meu #pai#, aquele não é Eleg? Perguntou Xangô, apontando na
direção do cafião.
- Sim! Mas o que aconteceu para estar tão absorto? Indagou Oxalá.
Eleg nunca foi visto daquele jeito, sempre aparecia animado, sorridente
e sempre atento, prestes a pregar a peça em alguém.
Tal comportamento despertava o interesse de qualquer um que o visse.
- O que aconteceu com você, meu filho? Indagou Oxalá, ao chegar perto de
Eleg - Parece que é algo muito grave!
O tristonho contou-lhes o que sucedera: a conduta de Oxum e o desprezo
de Yemanjá.
Frente à atitude de sua amada, Yemanjá, Oxalá começou a desconfiar dele,
devido seus antecedentes, já que tanto ele quanto Xangô não sabiam do
ocorrido. Frente ao relato, ele disse em tom punitivo, apoiando-se em
seu cajado:
- Vejo que você não tem jeito! Sempre arrumando confusão! Ordeno...
- Espere, meu #pai#! Atalhou Xangô - acredito que, antes de condená-lo,
deveríamos ouvir Oxum, para sabermos o que realmente aconteceu.
Diante do conselho de tão justo orixá, Oxalá pensou e decidiu ouvir a
versão de Oxum.
Os três dirigiram-se para o reino de Yemanjá rapidamente. Oxalá ouvia os
conselhos de Xangô, enquanto Eleg não dizia uma palavra.
O #senhor do fogo# não quis entrar no reino, seguiram então Oxalá e
Xangô, ansiosos para encontrarem Oxum.
Uma vez no reino de Yemanjá, Oxalá ordenou que a bela yabá viesse à sua
presença, para relatar-lhes o acontecido. Ela então veio e contou sua
versão, chorando e soluçando.
Quando o supremo tendia a acreditar na história dela, Xangô interviu,
dizendo que seria necessário colocar os dois frente a frente, para
apurar quem dizia a verdade.
Oxum mostrou-se resistente perante a ideia, temendo ser desmascarada.
Alegou estar com medo da fúria de Eleg. Sentindo que algo de errado
havia na recusa, Oxalá prometeu que nada lhe aconteceria e convocou
todos os orixás para um conselho.
O Julgamento de Oxalá
Ao contrário das festas, apenas os orixás estavam presentes no conselho.
Nanã mesmo distante e envergonhada por sua forma, esteve presente. Ela
recusava-se a chegar perto dos cafiões e, se pudesse opinar, certamente
condenaria Eleg, além de odiar qualquer ser masculino, adorava Oxum, a
única que foi visitá-la e presenteá-la após ter sido banida do reino por
Oxalá.
Ossãe, embora não sendo visto por ninguém, fazia-se presente, de quando
em quando assobiava e ria. Muitas versões corriam entre todos, muitas
delas já haviam sofrido os efeitos da boca-a-boca transformando-se nas
mais absurdas histórias.
Xangô prostrou-se ao lado de Oxalá, enquanto Eleg e Oxum ficaram em pé
frente a frente no centro do conselho. Os olhos de fogo soltavam
chispas, enquanto os olhos d#água dela lacrimejavam.]
- Com o poder que me foi concedido por Olorum, o criador, convoquei a
todos, para presenciarem este julgamento.
Espero que todos tomem por conhecimento o que virem e ouvirem hoje!
Falou Oxalá com eloquência.
Sob os olhos dele, Xangô conduziu o julgamento.
Pediu a Eleg e Oxum que contassem suas versões.
Depois chamou Ifá para esclarecer sobre os búzios.
Com o coração partido, já que tinha que desmentir a versão de sua
sobrinha e filha de criação, contou a todos como e porque deu o jogo ao
cafião.
À medida que Ifá relatava, Eleg enchia-se de razão e Oxum ia curvando-se
sobre si.
- Ifá! Disse Oxalá, acredito que não agiu certo dando tão poderoso jogo
a um só orixá!
- Sim, Oxalá! Eu concordo. Para corrigir isto - disse Ifá, pegando os
búzios e jogando-os para o céu - determino que a partir de agora cada
búzio representará um orixá no jogo. E como a princípio eu o dei a Eleg,
todos que forem consultar este jogo deverão pedir permissão a ele.
Para esclarecer sobre a esfera, Odudua fez-se presente.
- Venho falar em verdade, pois presenciei o fato.
Eleg, preso em sua ambição, retirou esta bola brilhante de uma aldeia,
que ruiu pela falta de tal artefacto e, mesmo tendo sido alertado do que
poderia acontecer, nem sequer se abalou.
Após o relato da #mãe natureza# houve um burburinho entre os presentes,
Eleg abaixou a cabeça e cerrou os punhos. Xangô sentou-se e Oxalá
levantou-se dizendo: - Visto os fatos, concluo que: tanto um quanto
outro erraram: por um lado Oxum roubou artefactos que pertenciam a um
outro orixá, por outro lado, Eleg mentiu, dizendo ter tirado um pedaço
de Oorum, mas de facto dizimou uma aldeia. Diante dos fatos eu decido
que a esfera dourada não ficará com nenhum dos dois, mas pertencerá a
ambos: o metal ficará incrustado nas rochas, aprisionando a ganância de
Eleg, mas para ser tirado, precisará ser garimpado nas águas, para lavar
a inveja de Oxum.
Enquanto a yabá chorava, Eleg falou irado.
- Acato o veredicto - virando-se para Oxum, praguejou - já que fui
enganado e julgado por conta deste metal, todo aquele que tiver contacto
com ele, assim como você, mostrará seus demónios, sendo tomado pela
nossa ambição presa nele.
Ao sair do conselho, Eleg irado jurou para si que sempre perseguiria
tanto Oxum quanto qualquer um que vivesse sob sua protecção (daí
nasceram os epurins, filhos(as) de Oxum perseguidos por Eleg), e, como
vingança, inseriu sementes negras nos frutos predilectos dela, os
mamões, para que, quando ela fosse comer, sentisse sua presença e se
lembrasse do mal que lhe fez.

XIV 
Exu instaura o conflito entre Yemanjá, Oyá e Oxum
Um dia, foram juntas ao mercado Oyá e Oxum, esposas de Xangô, e Yemanjá,
esposa de Ogum.
Exu entrou no mercado conduzindo uma cabra.
Ele viu que tudo estava em paz e decidiu plantar uma discórdia.
Aproximou-se de Yemanjá, Oyá e Oxum e disse que tinha um compromisso
importante com Orunmilá.
Ele deixaria a cidade e pediu a elas que vendessem sua cabra por vinte
búzios. Propôs que ficassem com a metade do lucro obtido.
Yemanjá, Oyá e Oxum concordaram e Exu partiu.
A cabra foi vendida por vinte búzios. Yemanjá, Oyá e Oxum puseram os dez
búzios de Exu à parte e começaram a dividir os dez búzios que lhes
cabiam. Yemanjá contou os búzios. Haviam três búzios para cada uma
delas, mas sobraria um. Não era possível dividir os dez em três partes
iguais. Da mesma forma Oyá e Oxum tentaram e não conseguiram dividir os
búzios por igual. Aí as três começaram a discutir sobre quem ficaria com
a maior parte.
Yemanjá disse: "É costume que os mais velhos fiquem com a maior porção.
Portanto, eu pegarei um búzio a mais".
Oxum rejeitou a proposta de Yemanjá, afirmando que o costume era que os
mais novos ficassem com a maior porção, que por isso lhe cabia.
Oyá intercedeu, dizendo que , em caso de contenda semelhante, a maior
parte caberia à do meio.
As três não conseguiam resolver a discussão. Então elas chamaram um
homem do mercado para dividir os búzios equitativamente entre elas. Ele
pegou os búzios e colocou em três montes iguais. E sugeriu que o décimo
búzio fosse dado a mais velha. Mas Oyá e Oxum, que eram a segunda mais
velha e a mais nova, rejeitaram o conselho. Elas se recusaram a dar a
Yemanjá a maior parte.
Pediram a outra pessoa que dividisse equitativamente os búzios. Ele os
contou, mas não pôde dividi-los por igual. Propôs que a parte maior
fosse dado à mais nova. Yemanjá e Oyá não concordaram.
Ainda um outro homem foi solicitado a fazer a divisão. Ele contou os
búzios, fez três montes de três e pôs o búzio a mais de lado. Ele
afirmou que, neste caso, o búzio extra deveria ser dado àquela que não é
nem a mais velha, nem a mais nova. O búzio devia ser dado a Oyá. Mas
Yemanjá e Oxum rejeitaram seu conselho. Elas se recusaram a dar o búzio
extra a Oyá.
Não havia meio de resolver a divisão.
Exu voltou ao mercado para ver como estava a discussão. Ele disse: "Onde
está minha parte?".
Elas deram a ele dez búzios e pediram para dividir os dez búzios delas
de modo equitativo.
Exu deu três a Yemanjá, três a Oyá e três a Oxum. O décimo búzio ele
segurou.
Colocou-o num buraco no chão e cobriu com terra.
Exu disse que o búzio extra era para os antepassados, conforme o costume
que se seguia no Orun.
Toda vez que alguém recebe algo de bom, deve-se lembrar dos
antepassados. Dá-se uma parte das colheitas, dos banquetes e dos
sacrifícios aos Orixás, aos antepassados. Assim também com o dinheiro.
Este é o jeito como é feito no Céu. Assim também na terra deve ser.
Quando qualquer coisa vem para alguém, este deve-se dividi-la com os
antepassados. "Lembrai que não deve haver disputa pelos búzios."
Yemanjá, Oyá e Oxum reconheceram que Exu estava certo. E concordaram em
aceitar três búzios cada.
Todos os que souberam do ocorrido no mercado de Oió passaram a ser mais
cuidadosos com relação aos antepassados, a eles destinando sempre uma
parte importante do que ganham com os frutos do trabalho e com os
presentes da fortuna.
[Lenda 24 do Livro Mitologia dos Orixás ]

XV 
Esú torna-se o amigo predilecto de Orunmila
Como se explica a grande amizade entre Orunmila e Exu, visto que eles
são opostos em grandes aspectos ?
Orunmila, filho mais velho de Olorun, foi quem trouxe aos humanos o
conhecimento do destino pelos búzios. Exu, pelo contrário, sempre se
esforçou para criar mal-entendidos e rupturas, tanto aos humanos como
aos Orixás. Orunmila era calmo e Exu, quente como o fogo.
Mediante o uso de conchas adivinhas, Orunmila revelava aos homens as
intenções do supremo deus Olorun e os significados do destino. Orunmila
aplainava os caminhos para os humanos, enquanto Exu os emboscava na
estrada e fazia incertas todas as coisas. O carácter de Orunmila era o
destino, o de Exu, era o acidente. Mesmo assim ficaram amigos íntimos.
Uma vez, Orunmila viajou com alguns acompanhantes. Os homens de seu
séqüito não levavam nada, mas Orunmila portava uma sacola na qual
guardava o tabuleiro e os Obis que usava para ler o futuro.
Mas na comitiva de Orunmila muitos tinham inveja dele e desejavam
apoderar-se de sua sacola de adivinhação. Um deles mostrando-se muito
gentil, ofereceu-se para carregar a sacola de Orunmila. Um outro também
se dispôs à mesma tarefa e eles discutiram sobre quem deveria carregar a
tal sacola.
Até que Orunmila encerrou o assunto dizendo: "Eu não estou cansado. Eu
mesmo carrego a sacola".
Quando orunmila chegou em casa, reflectiu sobre o incidente e quis saber
quem realmente agira como um amigo de fato. Pensou então num plano para
descobrir os falsos amigos. Enviou mensagens com a notícia de que havia
morrido e escondeu-se atrás da casa, onde não podia ser visto. E lá
Orunmila esperou.
Depois de um tempo, um de seus acompanhantes veio expressar seu pesar. O
homem lamentou o acontecido, dizendo ter sido um grande amigo de
Orunmila e que muitas vezes o ajudara com dinheiro. Disse ainda que, por
gratidão, Orunmila lhe teria deixado seus instrumentos de adivinhar.
A esposa de Orunmila pareceu compreende-lo, mas disse que a sacola havia
desaparecido. E o homem foi embora frustrado.
Outro homem veio chorando, com artimanha pediu a mesma coisa e também
foi embora desapontado. E assim, todos os que vieram fizeram o mesmo
pedido. Até que Exu chegou.
Exu também lamentou profundamente a morte do suposto amigo. Mas disse
que a tristeza maior seria da esposa, que não teria mais pra quem
cozinhar. Ela concordou e perguntou se Orunmila não lhe devia nada. Exu
disse que não. A esposa de Orunmila persistiu, perguntando se Exu não
queria a parafernália de adivinhação
Exu negou outra vez. Aí Orunmila entrou na sala, dizendo: "Exu, tu és
sim meu verdadeiro amigo!".
Depois disso nunca teve amigos tão íntimos, tão íntimos como Exu e
Orunmila.
[ lenda 27 do Livro Mitologia dos Orixás]

XVI
Exu leva aos homens o oráculo de Ifá
Em épocas remotas os deuses passaram fome. Às vezes, por longos
períodos, eles não recebiam bastante comida de seus filhos que viviam na
Terra.
Os deuses cada vez mais se indispunham uns com os outros e lutavam entre
si guerras assombrosas. Os descendentes dos deuses não pensavam mais
neles e os deuses se perguntavam o que poderiam fazer. Como ser
novamente alimentados pelos homens ? Os homens não faziam mais oferendas
e os deuses tinham fome. Sem a protecção dos deuses, a desgraça tinha se
abatido sobre a Terra e os homens viviam doentes, pobres, infelizes.
Um dia Exu pegou a estrada e foi em busca de solução. Exu foi até
Iemanjá em busca de algo que pudesse recuperar a boa vontade dos homens.
Iemanjá lhe disse: "Nada conseguirás. Xapanã já tentou afligir os homens
com doenças, mas eles não vieram lhe oferecer sacrifícios".
Iemanjá disse: "Exu matará todos os homens, mas eles não lhe darão o que
comer. Xangô já lançou muitos raios e já matou muitos homens, mas eles
nem se preocupam com ele. Então é melhor que procures solução em outra
direcção. Os homens não tem medo de morrer. Em vez de ameaçá-los com a
morte, mostra a eles alguma coisa que seja tão boa que eles sintam
vontade de tê-la. E que, para tanto, desejem continuar vivos".
Exu retornou o seu caminho e foi procurar Orungã.
Orungã lhe disse: "Eu sei por que vieste. Os dezasseis deuses têm fome.
É preciso dar aos homens alguma coisa de que eles gostem, alguma coisa
que os satisfaça.. Eu conheço algo que pode fazer isso. É uma grande
coisa que é feita com dezasseis caroços de dendê. Arranja os cocos da
palmeira e entenda seu significado. Assim poderás conquistar os homens".
Exu foi ao local onde havia palmeiras e conseguiu ganhar dos macacos
dezasseis cocos. Exu pensou e pensou, mas não atinava no que fazer com
eles. Os macacos então lhe disseram: "Exu, não sabes o que fazer com os
dezasseis cocos de palmeira? Vai andando pelo mundo e em cada lugar
pergunta o que significam esses cocos de palmeira. Deves ir a dezasseis
lugares para saber o que significam esses cocos de palmeira. Em cada um
desses lugares recolherás dezasseis odus. Recolherás dezasseis
histórias, dezasseis oráculos. Cada história tem a sua sabedoria,
conselhos que podem ajudar os homens. Vai juntando os odus e ao final de
um ano terás aprendido o suficiente. Aprenderás dezasseis vezes
dezasseis odus. Então volta para onde moram os deuses. Ensina aos homens
o que terás aprendido e os homens irão cuidar de Exu de novo".
Exu fez o que lhe foi dito e retornou ao Orun, o Céu dos Orixás. Exu
mostrou aos deuses os odus que havia aprendido e os deuses disseram:
"Isso é muito bom".
Os deuses, então, ensinaram o novo saber aos seus descendentes, os
homens. Os homens então puderam saber todos os dias os desígnios dos
deuses e os acontecimentos do porvir. Quando jogavam os dezasseis cocos
de dendê e interpretavam o odu que eles indicavam, sabiam da grande
quantidade de mal que havia no futuro. Eles aprenderam a fazer
sacrifícios aos Orixás para afastar os males que os ameaçavam. Eles
recomeçavam a sacrificar animais e a cozinhar suas carnes para os
deuses. Os Orixás estavam satisfeitos e felizes. Foi assim que Exu
trouxe aos homens o If'á.
[Lenda 28 do livro Mitologia dos Orixás]

XVII
Eshu, o filho faminto de Orunmilá
Um dia Orunmilá foi procurar Oxalá em seu palácio.
Orunmilá e sua mulher queriam ter um filho.
Chegando ao palácio de Oxalá, Orunmilá encontrou Eshu Yangui sentado à
esquerda da entrada principal. Já dentro do palácio, e diante do velho
rei, Orunmilá fez seu apelo, escutando de Oxalá uma resposta negativa.
O velho rei afirmou-lhe que ainda não era tempo da chegada de um filho.
Orunmilá, insatisfeito e ao mesmo tempo curioso, perguntou a Oxalá quem
era aquele menino sentado à porta do palácio e pediu ao rei, se poderia
levá-lo como filho. Oxalá garantiu-lhe que não era o filho ideal de se
ter, ao que Orunmilá insistiu tanto em seu pedido que obteve a graça de
Oxalá.
Tempos depois nasceu Eshu, filho de Orunmilá. Para espanto dos pais,
nasceu falando e comendo tudo o que estava à sua volta, acabando por
devorar a própria mãe. Eshu aproximou-se de Orunmilá para também
comê-lo.
Entretanto, o adivinho tinha consigo uma espada e enfurecido, partiu
para matar o filho. Eshu fugiu, sendo perseguido por Orunmilá, que a
cada espaço do céu alcançava-o, cortando Eshu em duzentos e um pedaços.
A cada encontro, o ducentésimo primeiro pedaço transformava-se novamente
em Eshu. Assim terminaram por atingir o último espaço sagrado e, como
não tinham mais saída, resolveram entrar num acordo. Eshu devolveu tudo
o que havia comido, inclusive sua mãe, em troca seria sempre saudado
primeiro em todos os rituais.

XVIII
Porque Eshu não deve viver na Casa de Oxalá
Eshu gostava muito de dançar e para ir a uma festa fazia qualquer coisa.
Um dia havia uma festa e ele não podia ir porque não tinha dinheiro.
Fez todos os esforços possíveis até que, como última alternativa, chegou
a casa de Oxalá e prometeu limpar-lhe a casa todos os dias se ele o
livrasse de um grande apuro que tinha.
Oxalá aceitou e pagou-lhe adiantado, pelo que Eshu pode ir à festa nessa
noite.
Esteve muito contente e divertiu-se muitíssimo, estando tão cansado no
outro dia que lhe custou fazer o trabalho a Oxalá como tinham combinado.
A limpeza foi feita de má vontade, nesse e em todos os outros dias.
Enquanto isto sucedia, Oxalá ficou doente repentinamente, a tal ponto
que teve que consultar Orunmilá. Nesta consulta saiu que na sua casa
havia alguém que não era dali e que era necessário que se fosse embora.
Que apenas esse alguém saísse de sua casa, ele melhoraria de saúde, e
também lhe foi dito que aquele que estava em sua casa se sentia preso e
que essa era a razão da sua enfermidade.
Oxalá recordou-se do rapaz que tinha na sua casa para a limpeza, mas não
o despediu de imediato, e, quando houve outra festa na povoação
disse-lhe: "Toma este dinheiro e vai à festa.
Já não me deves nada, mas não me abandones e visita-me quando quiseres".
Eshu foi-se embora muito contente e desde esse momento Oxalá começou a
melhorar e curou-se da doença que tinha.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Série África- Culto de babaegum

https://youtu.be/Jjesbk49GKI